Segunda, 27 de junho de 2011
Por Ivan de Carvalho
Os ex-presidentes da
República Fernando Collor e José Sarney, este atualmente presidente do Senado,
se opõem à proposta de acabar com a possibilidade de sigilo eterno dos
documentos oficiais no país. E expuseram seus argumentos – que não foram
revelados ao público, pois talvez sejam também secretos – à presidente Dilma
Rousseff. Mas soube-se, pelo menos, que eles disseram estar preocupados com
documentos relacionados com as relações exteriores, incluindo fronteiras e
guerras das quais o Brasil participara.
A presidente, segundo o
noticiário, por isto teria mudado de posição, ela que era a favor do fim do
sigilo para os documentos classificados como ultra-secretos. Pretendia que tais
documentos ficassem sob sigilo durante 25 anos, prorrogáveis por mais 25 e fim.
Nenhum sigilo além desse período.
Ontem, a Folha de S. Paulo,
na coluna Painel, conta uma história diferente ou, pelo menos, colateral. Dilma
teria mudado de opinião e aceito a tese da possibilidade de prorrogações do
sigilo por vezes ilimitadas (o sigilo eterno) por influência do ministro das
Relações Exteriores, o diplomata Antônio Patriota.
Então a mudança de posição
da presidente sobre o assunto foi tornada pública, mas ela instruiu o ministro
a determinar uma verificação nos documentos do Itamaraty. Baseado nessa
pesquisa, o ministro disse à presidente que nada havia que exigisse sigilo
eterno. Ora, se não estão nas relações exteriores, fronteiras e guerras os
problemas, talvez estejam nas biografias dos dois ex-presidentes, embora isto
haja sido o que eles haviam se apressado a negar em primeiro lugar.
Agora, diante da conclusão
da pesquisa nos alfarrábios do Itamaraty, a presidente voltou a defender o fim
do sigilo eterno e o prazo máximo de 50 anos de segredo – 25 anos, prorrogáveis
por mais 25. Para delícia ou vergonha dos brasileiros, coisas comparáveis à
mensagem do Barão do Rio Branco em que pedia ao governo moças e cavalos para
ajudar a resolver a questão do Acre poderão ser conhecidas.
Talvez este haja sido o mais importante caso de
suborno da história brasileira. Aliado a uma das maiores mentiras, inaugurando
a nossa tradição de grandes promessas não cumpridas. É que prometemos à
Bolívia, como uma compensação pela perda territorial que o país vizinho ia
sofrer, a construção de uma ferrovia que ligaria o atlântico ao pacífico, passando
pela Bolívia, um país que não tem saída para o mar. Para mar nenhum. Ganha a
eleição, perdão, ganho o Acre, esquecemos solenemente a ferrovia.
Eu mesmo não entendo como é que o companheiro Evo
Morales não chamou Lula, ou agora, Dilma, para dizer que mais vale esquecer
essa história de trem bala (que era só entre Rio e São Paulo e ameaça, pelo
menos nos planos, tornar-se uma epidemia) e cumprir a secular promessa da
ferrovia prometida.
Mas, deixando o Acre, onde o barão alegou a posse
como base do nosso direito (afinal, estava deserto de bolivianos e os
brasileiros ocupavam o território), os documentos realmente secretos, aqueles
que o governo não aceite mesmo divulgar, não serão atingidos pela legislação em
elaboração. É que destes documentos o governo nunca reconhecerá a existência. E
não se pode dar acesso ao que não existe.
- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta segunda.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.