Acossado
pelos interesses que denunciou na Carta-testamento, Getúlio Vargas
preferiu o suicídio a renunciar. Ante a iminência de sua vitória nas
eleições de 2 de outubro de 1950, o presidente Dutra promulgou a Lei
1.079, regulamentando o impeachment, prenúncio de que a vontade popular
não seria respeitada. O suicídio de Vargas em 1954 adiou o golpe para
1964.
Jango,
deposto pelas mesmas forças que propiciaram o suicídio de Vargas, fora
ministro do Trabalho de Getúlio e vice de Juscelino Kubistchek. Em
eleições desvinculadas, tivera mais votos que JK. Em poucos momentos da
História do Brasil um presidente teve auxiliares do nível de João
Goulart. Foram seus ministros: Almino Affonso, Carvalho Pinto, Celso
Furtado, Darcy Ribeiro, Evandro Lins e Silva, Hélio Bicudo, Hermes Lima,
João Mangabeira, San Tiago Dantas e Waldir Pires.
Na
noite de 31 de março de 1964, o comandante do 2º Exército, Amaury
Kruel, condicionou apoio ao presidente à prisão dos comunistas, o
fechamento da Central Geral dos Trabalhadores e da UNE. Jango recusou.
Perdeu o apoio político e militar, mas não compactuou com os facínoras
golpistas. Com o seu espólio as forças democráticas resistiram à
ditadura e restabeleceram a democracia.
É
emblemático que um dos ministros de Jango, Hélio Bicudo ( à direita na
foto), tenha sido o promotor de justiça que levou ao banco dos réus de
Tribunal do Júri o delegado Fleury, símbolo da repressão. Igualmente é
emblemático que em Santo André, São Bernardo do Campo e São Caetano do
Sul, ABC paulista, tenham se realizado, em dezembro de 1967, comícios da
Frente Ampla contra o regime que se instalava, maiores manifestações
operárias do Brasil até então.
Mas,
hoje, depois de criar a Força Nacional, sem lei ou autorização
constitucional, apoiar a repressão nas Jornadas de Junho de 2013 e
rechaçar manifestantes com uso do Exército por ocasião da privatização
do ‘Campo Petrolífero de Libra’, o governo encaminhou ao Congresso um
projeto de lei que, a pretexto de criminalizar o terrorismo, criminaliza
os movimentos sociais. Os assuntos de Estado ficaram sujeitos às
conveniências cotidianas, sem institucionalidade, tal como as barganhas
nos botequins onde as discussões sobre ministérios e times de futebol
somente se realizavam enquanto durava a bebedeira.
João Batista Damasceno é doutor em Ciência Política e juiz de Direito
fonte: O Dia