Quinta, 15 de outubro
de 2015
Do MPF
Pedido feito hoje à
Justiça Federal é de paralisação total do porto até que seja dada solução para
as carcaças e o óleo do navio Haidar, que afundou no dia 6 com 5 mil cabeças de
gado
A
carga de bois mortos está estimada em 3,8 mil toneladas (foto em 6 de outubro
por Walrimar Santos, da Ascom da Polícia Civil/PA)
O
Ministério Público Federal no Pará (MPF/PA), o Ministério Público do Estado do
Pará (MP/PA) e a Defensoria Pública do Estado do Pará (DPE/PA) entraram com ação
judicial nesta quinta-feira, 15 de outubro, na Justiça Federal em Belém,
pedindo a paralisação total das atividades no porto de Vila do Conde, em
Barcarena, até que seja apresentada uma solução para a remoção total das
carcaças e do óleo do navio Haidar, de bandeira libanesa, que afundou no último
dia 6 de outubro com uma carga de 5 mil bois vivos. São réus na ação a
Companhia Docas do Pará (CDP), responsável pelo porto e as companhias Global
Norte Trade e Minerva, responsáveis pela operação portuária e pelos bois.
As
instituições, que acompanham a evolução do desastre desde o naufrágio, querem
que o porto permaneça fechado até que as carcaças de bois que se soltaram do
casco do navio e contaminam as praias da região sejam removidas na totalidade.
Também pedem que seja assegurado o fornecimento de máscaras contra odor, água
potável e ajuda financeira para os moradores impactados e que seja aprovado um
cronograma para retirada de todo o óleo e das carcaças que ainda estão contidos
no navio. O porto não tinha plano de contingências para esse tipo de ocorrência
e a demora em tomar providências aumenta, a cada dia, a extensão da catástrofe
ambiental.
O
navio está adernado no porto e foi feita uma barragem de contenção pela CDP na
tentativa de evitar que fossem liberados nas águas os quase 4,8 mil animais
mortos dentro do casco do navio, assim como cerca de 700 mil litros de óleo
diesel. Seis dias depois do naufrágio, na madrugada da segunda, 12 de outubro,
a barreira se rompeu e uma pequena parte da carga, já em avançado estado de
putrefação e contaminada por óleo, foi dar nas praias do município de
Barcarena, onde fica o porto, e nas de Abaetetuba, município vizinho.
Centenas
de moradores dessas praias usam máscaras para suportar o mau cheiro dos animais
em estado de decomposição. O MPF/PA e a DPE/PA solicitaram o remanejamento das
famílias, que se negam a sair do local e ir para o ginásio de esportes do
município porque temem furtos às residências. Crianças e idosos passam mal com
os vapores das carcaças em decomposição. A água da região pode estar
contaminada e as comunidades agora dependem das autoridades para o fornecimento
de água potável. Muitas famílias perderam o sustento, porque são ribeirinhos
que vivem dos recursos pesqueiros.
“A
contaminação decorrente do derramamento do óleo, bem como dos corpos de animais
em putrefação, já atingiu o fornecimento de água potável na região afetada,
densamente povoada, seja por ribeirinhos, seja por comunidade urbana ou rural”,
diz a ação judicial. Para MPF/PA, MP/PA e DPE/PA, “as medidas até aqui tomadas
pelos responsáveis não surtiram efeito, seja quanto ao óleo já derramado, seja
quanto ao óleo ainda existente na embarcação ou, ainda, quanto aos animais,
estejam eles dentro da embarcação, estejam na contenção ou nas praias da
região.”
Ainda
não se sabe a quantidade de óleo que vazou, mas a mancha se espalha por alguns
quilômetros das águas. Calcula-se que cerca de 4 mil animais permaneçam dentro
do casco do navio e, caso não se assegure a retirada rápida, o desastre pode
ser muito maior. A carga de bois mortos está estimada em 3,8 mil toneladas.
“Embora
os números ainda sejam imprecisos, sabe-se que não mais de 30 animais foram
resgatados com vida, enquanto outros animais (cuja estimativa oscila em torno
de 200) chegaram a deixar a embarcação antes do naufrágio, alguns dos quais
foram abatidos pela população, enquanto a expressiva maioria, morta por
afogamento, remanesce flutuando, em contenção realizada no local, de modo que
aproximadamente 4.800 (quatro mil e oitocentos) indivíduos ainda se encontram
presos no interior da embarcação naufragada”, narra a ação judicial.
Falta
de consenso - As instituições envolvidas ainda não conseguiram chegar a um
consenso sobre a melhor forma de solucionar todos os problemas causados pelo
naufrágio e a tensão aumenta em Barcarena, onde a população tem feito protestos
contra uma das soluções apresentadas, de enterrar as carcaças em terreno no
município.
A
Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará (Semas) autuou
as três entidades responsáveis pela situação, CDP, Minerva e Global, exigindo
medidas urgentes e eficazes para retirada dos restos do naufrágio. Até 9 de
outubro, a Semas aplicou multa diária de R$ 200 mil e, a partir de então,
diante da falta de ações, aumentou a multa para R$ 1 milhão por dia.
O
Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama) também notificou a CDP e as
empresas Minerva e Global para que retirem e incinerem o material orgânico,
para prevenir contaminação ainda maior das águas superficiais e lençóis
freáticos da região, por necrochorume (líquido da decomposição dos corpos). A
carga total contida no navio pode gerar mais de 1 milhão de litros de
necrochorume.
A
proposta do Ibama sofreu alteração pela empresa responsável pela salvatagem
(retirada dos restos do naufrágio), passando a prever que as cavas sejam
abertas e os animais lá enterrados, sem queima, criando-se um cemitério. “A
proposta inicial (da empresa de salvatagem) seria o puro e simples depósito,
sendo, posteriormente, alterado para a inclusão de uma manta de
impermeabilização, buscando proteger o lençol freático e outras formas de
contaminação, já que os animais, além de putrefatos, estão contaminados por
óleo.”
A
proposta do Ibama sofreu ainda resistência do Corpo de Bombeiros, porque a área
inicialmente prevista para a incineração dos bois era cercada por floresta
densa. Agora, estuda-se outra área para fazer a incineração, ainda que algumas
das instituições envolvidas ainda resistam em fazer a queima das carcaças.
Quanto à retirada do óleo da embarcação, o trabalho pode demorar até 19 dias.
“Fácil
identificar o risco da manutenção da situação e a necessidade de que todos os
esforços se concentrem na solução da demanda, o que inclui reconhecer ter
faltado senso de urgência nas atividades desenvolvidas pela CDP e pelos demais
responsáveis pelo dano ambiental.”, diz a ação judicial, que aponta o fato de
que, em meio à situação de tamanha gravidade, o funcionamento do porto segue
normal com embarque diário de grãos e minérios.
Impactos
sociais - Enquanto autoridades públicas e empresas privadas não chegam a um
acordo sobre a solução, os impactos sobre a população tendem a se agravar. Em
correspondência eletrônica enviada ao MPF/PA, MP/PA e DPE/PA, a secretária de
assistência social de Barcarena, Juliena Nobre Soares narrou em breves linhas a
extensão do impacto sobre os moradores do município mais atingido, que decretou
Estado de Emergência: “durante algumas visitas as famílias de pescadores nos
relataram que tiveram seus materiais de pesca (redes e matapis) destruídos por
causa do óleo que adentrou os rios e igarapés, bem como apresentaram alergias
devido contato com água na tentativa de recuperar os materiais de pesca, dores
de cabeça e tonturas em função do forte cheiro de óleo.”
“De
acordo com relatos dos mesmos, as águas dos rios também eram utilizadas para
higiene pessoal e de utensílios domésticos e até mesmo para consumo (ingestão),
sendo que após o naufrágio essas famílias deixaram de utilizar a água, ficando
sem alternativas de sobrevivência. Ressaltamos que a praia encontra-se
interditada, logo, os atingidos também foram os barraqueiros que sobrevivem do
comércio na beira da praia”, prossegue. Eles podem perder as mercadorias que
tinham estocado para atender a clientela. “No que se refere aos ribeirinhos,
estes possuem relação direta com os rios e igarapés, utilizando o rio como meio
de sobrevivência, tanto para o consumo de peixes e camarões, como para o
consumo de água para utilização de higiene pessoal e doméstica, além do lazer e
recreação”, explica.
A
ação judicial tramita na 9a Vara da Justiça Federal em Belém e ainda não tem
número processual.