Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Um bom documentário sobre um péssimo personagem histórico

Segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Por Celso Lungaretti
Um slogan de outrora: "hoje mocinho, amanhã bandido".
A seção Filmes para ver no blogue inclui obras que trazem informações importantes para se conhecer a história deste país, mesmo que desagradáveis como o documentário Cidadão Boilesen (d. Chaim Litewski, 2009), por se referir ao personagem paradigmático da participação de empresários no financiamento dos órgãos de repressão durante a ditadura de 1964/85: Henning Albert Boilesen, presidente do grupo Ultra. Nada contra o (correto) trabalho de Litewski, mas seu biografado revira o estômago de qualquer homem de bem.
A Operação Bandeirantes foi criada em junho de 1969 para combater a luta armada em São Paulo com utilização sistemática e ilimitada da tortura e licença para matar, travando a guerra suja com métodos tão imundos que as próprias Forças Armadas inicialmente relutaram em ficarem identificadas com eles.
Como se manipulava: ele não foi justiçado por ser  industrial.   

Assim, tendo oficiais do Exército (atuando sempre à paisana) no comando e policiais civis como subalternos, instalou-se nos fundos de uma delegacia paradoxalmente instalada no bairro paulistano do Paraíso. Meu companheiro de movimento estudantil e militância revolucionária Gilson Theodoro de Oliveira, falecido há alguns meses, teve a duvidosa honra de ser o primeiro preso político torturado na Oban, ainda na fase de testes.
Como sua existência era real e não legal, não podia receber verbas da União e os custos da bestialidade foram, num primeiro momento, bancados por endinheirados reaças como o Boilesen, que assim adquiriam o direito de presenciarem o edificante espetáculo das torturas, realizando o sonho da maioria dos sádicos: o de verem pessoas nuas sendo brutalizadas. Segundo consta, Boilesen era um dos que assistiam, mas não chegava ao extremo de querer participar também, como alguns mais depravados faziam questão.
Boilesen e Delfim: feitos um para o outro. 
Foi justiçado pelo MRT e a VPR em abril de 1971, aos 55 anos, o que fez dele o símbolo do apoio empresarial à repressão, embora congêneres existissem em penca. Assim como Solange Teixeira Hernandes, a dona Solange, não era a única censora, mas se tornou a representante paradigmática das tesouras afiadas porque seu nome aparecia nas guias do Departamento de Censura da Polícia Federal projetadas nos cinemas antes início dos filmes.
O documentário inclui entrevistas do filho de Boilesen (Hennig Jr.), Jarbas Passarinho, D. Paulo Evaristo Arns, Celso Amorim e FHC, entre outros.
E, por falar em Passarinho, que passará à História como autor da frase mais emblemática dos responsáveis pelo terrorismo de estado nos anos de chumbo, as Forças Armadas mandaram os escrúpulos às favas em 1970 e saíram do armário: a Oban foi oficializada e passou, com o nome de DOI-Codi, a contar com recursos da União. Mas, foi graças a indivíduos como o Boilesen que funcionou durante todo o segundo semestre de 1969.