Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

O Jogo

Quarta, 16 de outubro de 2013
Escrito por Letícia Silva Sousa*

O despertador toca. São 5 e 20 da manhã. Ana acende a luz e começa o ritual de todos os dias. Toma banho, se arruma, come alguma coisa o mais rápido possível e sai correndo para não chegar atrasada. Para não chegar atrasada?  Mas a reunião não é apenas às 8 e meia? Sim. A reunião é depois de 8 horas, só que antes de chegar lá, tem que passar por todo aquele teste físico e psicológico.  É, aquele mesmo. Aquele jogo, aquele teste que só os pequenos super-heróis do cotidiano são submetidos e que para alcançarem seus objetivos, eles precisam cumprir pequenas provas.
    Primeira fase, adquirir resistência a fatores ambientais. Independente de sol, vento, chuva, trovões, furacões, poças de lama e buracos no asfalto, é preciso resistir firme e forte. Para aumentar o grau de dificuldade, é necessário driblar o sono, a falta de um local para sentar (sim, a espera deve ser feita em pé), e não menos importante, a espera. A espera é a parte mais divertida da primeira fase, porque apesar de todo o planejamento, a única certeza é de que não há certeza. A tal da espera varia, pode ser 5 minutos, como pode ser 2 horas. Ás vezes a espera não tem fim, o objetivo não é alcançado e a pessoa é eliminada do jogo.  Ou, se o ônibus passar, parabéns você subiu de nível.
    Na segunda fase, você provavelmente continuará de pé. Mesmo pegando o ônibus na sua localidade de origem, há várias pessoas que estavam na sua frente (ou foram simplesmente pagas pelo governo para manterem os acentos ocupados e assim manterem tudo ainda mais interessante). Há dois níveis. Opção número 1, se sentado, enfrentará a má qualidade do serviço do ônibus, a sujeira e o sol. Opção número 2, não há lugares disponíveis, e do modo como já foi avisado anteriormente, você permanecerá de pé. Deverá suportar os mesmos fatores ambientais dos que estão sentados, só que de bônus, terá as pernas fortalecidas pela sua posição, os braços tonificados pelo material que carrega consigo e ainda irá fazer novas amizades, iniciadas do modo mais intimo possível, através do contato físico. Somado a tudo isso, claro, há a antiga conhecida, a espera. A espera e seu aliado inseparável, o tempo indeterminado.
   Após suportar toda essa aventura (se o ônibus não quebrar e o teste precisar ser reiniciado), cairá confetes do céu e aparecerá um famoso apresentador de televisão noticiando sua emocionante história para o mundo, ou você chegará ao seu local de destino, a tempo ou não, para o seu compromisso. O resultado pode variar dependendo do dia, e a distância em que o local de destino se encontra do de origem não é um fator determinante. A única regra que você deve aprender para jogar esse jogo, é que planos exatos não podem ser realizados. Para um melhor desempenho, você pode sair ainda mais cedo de casa, ou tentar fazer algo (buscar uma mudança/reforma política ou desistir do jogo e ficar em casa mesmo), fica a critério do jogador. 

*Jovem estudante de Jornalismo da Universidade Católica de Brasília. 
Este excelente texto foi elaborado para a disciplina Técnicas de Produção Jornalística.