Terça, 29 de outubro
de 2013
Por Ivan de Carvalho
Os paulistanos, em sua quase
totalidade, desaprovam a ação dos black blocs nas manifestações populares de
rua que tiveram seu ponto alto em junho e ainda se realizam com bem menos
intensidade e participação popular. Isto foi o que mostrou pesquisa do
Instituto Datafolha realizada na sexta-feira e cujos resultados foram
divulgados ontem pela Folha de S. Paulo e seu site na Internet.
Os números contra os black blocs
aparecem esmagadores nas pesquisas, dando uma indicação praticamente
inquestionável de que esse grupo ou movimento não tem futuro, tão alto é o grau
de rejeição de sua atuação pela sociedade. No caso, a sociedade da cidade de
São Paulo, a maior do país, mas não existem motivos para supor que, em outras
metrópoles ou aglomerações urbanas brasileiras menores essa rejeição seja
significativamente menor.
Na capital paulista, o Datafolha
detectou que 95 por cento das 690 pessoas entrevistadas – uma amostra
representativa do total da população da cidade – desaprovam a ação dos black
blocs, que buscam o confronto com a polícia e praticam a destruição de agências
bancárias, de lojas (frequentemente acompanhando isso com roubo de produtos),
depredação e tentativas de destruição – especialmente pelo fogo dos “coquetéis
molotov” – de prédios públicos, destruição de veículos automotores públicos, de
viaturas policiais a ônibus, e particulares. Também fazem pixações, atacam
cabines de venda de bilhetes do sistema de transportes (em São Paulo e caixas
eletrônicos). Se os encontrarem, atacarão também moinhos de vento.
Só para satisfazer eventuais
curiosidades. Na população jovem de 16 a 24 anos, a desaprovação aos black
blocs (ou à sua atuação, o que dá no mesmo) é de 87 por cento, conforme a
pesquisa. E essa é a faixa etária na qual a rejeição aos black blocs (que no
início eram chamados de vândalos pela mídia, mas conseguiram sair do português
para o inglês, a língua universal da civilização atual, uma maneira que lhes
facilita demonstrar como são radicalmente contrários a qualquer coisa que se
possa chamar de civilização, enquanto põem algum charme na denominação).
Bem, entre as pessoas mais velhas, 60
anos e além, a desaprovação aos black blocs – que vai rapidamente subindo à
medida que avança a idade dos entrevistados – alcança o patamar de 98 por
cento. Daí a média geral já citada, de 95 por cento.
Mas importa dizer que, com seus
músculos de touro e cérebros de galinha, os black blocs parece haverem influído
fortemente para tirar das ruas as centenas de milhares de pessoas que em junho
resolveram espontaneamente, sem qualquer tipo de aparato organizacional, de
apoio financeiro e de esquema publicitário (ressalvadas as “convocações” pelas
redes sociais da Internet), manifestar sua insatisfação, principalmente, com a
corrupção e a péssima qualidade dos serviços públicos, em especial a saúde, os
transportes urbanos e a educação.
O governo, em especial e o poder
político em geral, os grandes responsáveis por essas coisas, caíram do cavalo –
já estavam meio desconfiados, mas não esperavam tão cedo trombada tão
formidável. Foi um corre-corre impressionante, estavam se aproximando as
eleições, ela “fez o diabo” – como já admitiu que faz em relação a eleições –,
leu discursos a granel (o primeiro foi aquela peça quase incrível de recepção
ao papa Francisco no Palácio Guanabara, Rio de Janeiro), óbvia peça de campanha
político-eleitoral.
Prometeram mil coisas, nada fizeram,
salvo essa coisa controversa (e bota controvérsia nisso) do “Mais Médicos". De
2010 para cá foram suprimidos 13 mil leitos hospitalares do SUS no país, mostra
a revista Veja, que recuando uns
poucos anos mais chega aos 40 mil leitos desativados. Conheço uma pessoa que
está aguardando vaga para uma cirurgia no Hospital Ana Nery (federal), em
Salvador. Avançou cinco lugares na fila – cinco pessoas na frente morreram
antes que chegasse a vez delas serem tratadas.
Tudo isso está aí e muito mais,
incluindo os pibinhos e agora a inflação sempre no topo da meta. Razões para o
povo voltar às ruas, mas o governo tem uma linha auxiliar, os black blocs. A
violência deles – com a inestimável ajuda da polícia, que evita a prevenção e geralmente
reprime com atraso, o que não parece ser uma coisa à toa – mantém as multidões
em casa. Ponto para o governo.
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Este artigo foi publicado originariamente na Tribuna da Bahia.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.