Terça, 4 de outubro de 2014
Akemi Nitahara* – Repórter da Agência Brasil
A justiça do Rio de Janeiro condenou a agente de trânsito Luciana
Silva Tamburini a pagar indenização de R$ 5 mil para o juiz João Carlos
de Souza Correa. Ela processou o magistrado após receber voz de prisão e
ser levada para a delegacia por ele, flagrado em uma blitz da Lei Seca, na zona sul do Rio, dirigindo sem a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) em um veículo sem placa.
Luciana
determinou a apreensão do veículo e alega, de acordo com o processo,
que “o réu tentou se prevalecer do cargo para se esquivar do cumprimento
da lei”. A agente pediu indenização por dano moral, por ser submetida a
uma situação vexatória, ao ser conduzida para a delegacia, mas o juiz
contestou a acusação e pediu indenização, porque se sentiu ofendido ao
ouvir de Luciana que ele “é juiz, mas não é Deus”. O caso ocorreu há
três anos, e a decisão foi publicada na última sexta-feira (31).
Na
decisão, o desembargador José Carlos Paes, da 14ª Câmara Cível do
Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, esceveu que “a autora, ao abordar
o réu e verificar que o mesmo conduzia veículo desprovido de placas
identificadoras e sem portar sua carteira de habilitação, agiu com abuso
de poder, ofendendo o réu, mesmo ciente da relevância da função pública
desempenhada por ele”. Ele acrescenta que ao “apregoar que o réu era
'juiz, e não Deus', a agente de trânsito zombou do cargo por ele
ocupado, bem como do que a função representa na sociedade”.
O
desembargador diz ainda que “restou evidente, no caso em análise, que a
autora pretendia, com tal comportamento, afrontar e enfrentar o
magistrado, que retornava de um plantão judiciário noturno”. Além disso,
de acordo com a decisão de Paes, Luciana “desafiou a magistratura e
tudo o que ela representa”, ao “debochar” do juiz.
Ainda cabe
recurso da decisão, mas o caso já gerou repercussão na mídia e nas redes
sociais, em apoio à agente de trânsito. Foi criada até uma “vaquinha” online para arrecadar o valor da indenização, que já conseguiu mais de 70% do dinheiro, apenas no primeiro dia no ar.
Para
o presidente da Associação dos Magistrados do Estado do Rio de Janeiro
(Amaerj), Rossidélio Lopes da Fonte, não houve corporativismo no caso.
“Particularmente, eu não acredito nisso. Acho que foi um acontecimento
isolado, mas nesse caso específico só analisando a prova dos autos para
afirmar”.
Porém, de acordo com Fonte, o juiz deve se comportar como qualquer cidadão diante de uma blitz.
“Eu não posso falar pelo fato em si, mas a orientação que nós damos é
que o juiz se comporte como qualquer cidadão que é parado na Lei Seca. O
fato de você estar fora do exercício da magistratura não te permite
usar arbitrariamente qualquer posicionamento”.
O presidente da
Comissão de Legislação de Trânsito, da Ordem dos Advogados do Brasil,
Seccional Rio de Janeiro (OAB/RJ), Armando Souza, também evita falar em
corporativismo na decisão. “Não acredito. Eu não vislumbrei nenhuma
intenção por parte da agente de trânsito, de ofender a honra do
magistrado. O tribunal entendeu o contrário, e aplicou uma condenação
para que ela reparasse um dano que eu, no meu entendimento, não
percebi”.
Souza não acredita que a decisão possa influenciar no
comportamento dos agentes que trabalham nas operações da Lei Seca. “Não
acredito que isso possa ocorrer. Todos nós somos iguais perante a lei,
também o magistrado é igual e deve respeitar a legislação. Todos são
iguais - seja senador, magistrado, jogador de futebol, advogado. Todos,
temos que respeitar a lei”, reiterou.
Em nota, o Detran informou
que a corregedoria do órgão abriu processo disciplinar para apurar a
conduta dos agentes envolvidos na ocorrência, mas não constatou nenhuma
irregularidade. De acordo com a nota, “a Operação Lei Seca reitera que
todos os motoristas abordados nas blitze são submetidos aos mesmos procedimentos, e a atuação dos agentes está de acordo com a lei”.
*colaborou Maurício de Almeida, repórter da TV Brasil