Sexta, 21
de novembro de 2014
Isabela Vieira – Repórter da Agência Brasil
A capoeira
de roda será reconhecida como Patrimônio Cultural da Humanidade pela
Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco)
Dança, luta e símbolo de resistência, a capoeira de roda
deverá ser reconhecida como Patrimônio Cultural da Humanidade pela Organização
das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). Na semana
que vem, em Paris, o Comitê Intergovernamental para a Salvaguarda do Patrimônio
Cultural e Imaterial da Unesco anuncia sua decisão. Foram feitos 46 pedidos de
registro pelos Estados-Membros, sendo que 32 foram recomendados pelo órgão
técnico do comitê, entre os quais está o da capoeira – o único apresentado pelo
Brasil e um dos três bens da América Latina na lista. Com o reconhecimento, a
capoeira de roda se iguala ao Cristo Redentor como patrimônio da humanidade.
No dossiê de candidatura, de 25 páginas, o Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) enumera uma série de ações
para difundir a modalidade e propõe medidas de salvaguarda orçadas em mais de
R$ 2 milhões, como a produção de catálogos e encontros. O documento destaca que
o registro vai favorecer a consciência sobre o legado da cultura africana no
Brasil e o papel da capoeira no combate ao racismo e à discriminação. O dossiê
lembra que a prática chegou a ser considerada crime e foi proibida durante um
período da história. Hoje, a capoeira é praticada até fora do país.
“A capoeira é uma manifestação cultural de muitas
dimensões. É ao mesmo tempo luta, dança e jongo, tão ligada à nossa história, à
nossa sociedade, que é um pouco do que é o povo brasileiro”, explicou a
diretora do Departamento do Patrimônio Imaterial do órgão, Célia Corsino.
Já reconhecida como patrimônio cultural pelo Iphan desde
2008, a capoeira envolve os praticantes por meio do canto, dos instrumentos
típicos como o berimbau e o atabaque, em uma roda, onde os golpes se confundem
com a dança. Uma prática que é, ao mesmo tempo, jogo e brincadeira.
“A capoeira não é só um jogo, a capoeira é muito mais do
que isso, a história da capoeira se confunde com a própria história do país, já
foi utilizada até em guerra, como a do Paraguai”, diz mestre Paulinho Salmon,
capoeirista e professor por mais de 50 anos. Ele faz parte de um comitê de
mestres de capoeira no Rio que discute medidas de salvaguarda com o Iphan.
Os pedidos dos mestres para proteger a capoeira e seu aval
para registrá-la como patrimônio da humanidade também foram levados em conta no
dossiê entregue à Unesco. Entre eles, a possibilidade de a capoeira se tornar
disciplina obrigatória nas escolas e nos encontros de troca de conhecimento.
Segundo mapeamento do Iphan, a modalidade é praticada por todo o país.
No documento que recomenda o registro, o comitê técnico da
Unesco destaca que a capoeira nasce da resistência contra a discriminação e
favorece a convivência social entre pessoas diferentes. “[A roda] funciona como
uma afirmação de respeito mútuo entre comunidades, grupos e indivíduos e
promove a integração social e da memória da resistência à opressão histórica.”
No pedido, o Iphan também cita ações como o registro
nacional da capoeira de roda como um bem cultural, a criação de grupos de
trabalho, encontros e o prêmio Viva Meu Mestre, desenvolvidos com a sociedade
civil e órgãos de governo. Para o futuro, como patrimônio da humanidade, são
sugeridas medidas para promover a capoeira, contextualizá-la como legado
africano no Brasil, além de mapear as rodas e seus mestres.
Conhecido como um dos maiores portos de desembarque de
africanos, o Brasil organiza para 2015 o pedido de registro como patrimônio da
humanidade do Cais do Valongo, no centro do Rio de Janeiro. Estima-se que o país tenha recebido
40% de todos os africanos escravizados que chegaram vivos às Américas e,
desses, cerca de 60% entraram pelo Rio de Janeiro, segundo o antropólogo e
fotógrafo Milton Guran, do Comitê Científico Internacional do Projeto Rota do
Escravo da Unesco. O Cais do Valongo é considerado sagrado por religiões de
matriz africana.
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