Quinta-feira, 15 de
outubro de 2015
Do Blog Náufrago daUtopia
Por Celso Lungaretti
Pensei
em escrever algo sobre a morte de Brilhante Ustra, mas bateu o
desânimo: vivo como morto, valeria a pena desperdiçar meu tempo com
personagem tão medíocre? Tudo que havia para ser dito, já não o terá
sido por Hannah Arendt ao discorrer sobre a banalidade do mal?
O velho e bom arquivo me socorreu. Repassando antigos textos armazenados no blogue Celso Lungaretti - O Rebate,
encontrei um, de dezembro de 2006, no qual fiz uma espécie de epitáfio
precoce do Brilhante Ustra, colocando-o no lugar que merecia: um mero
pau mandado da bestialidade, tão obtuso que acreditava estar servindo a
pátria ao cumprir as ordens mais hediondas.
É o suficiente como registro do fim de uma trajetória tão inglória.
OS MOTIVOS DO TORTURADOR
Embora seja impossível simpatizar com os motivos de um Brilhante Ustra
ou, sequer, aceitá-los, eu compreendo muito bem o que o leva a sentir-se
traído e injustiçado.
Ao comandar o DOI-Codi, ele fez exatamente o que dele esperava o
Exército: combateu o inimigo por todos os meios a seu dispor, sem
importar-se com os direitos humanos, as convenções de Genebra e outras perfurmarias. Saiu-se vitorioso e foi aclamado por seus pares.
Veio a redemocratização e ele passou a ser estigmatizado como um
monstro... sozinho! Levou merecidamente a culpa por tudo aquilo que seus
comandados fizeram. Mas, ninguém se lembrou de cobrar de seus
superiores a responsabilidade maior que tiveram nas atrocidades
perpetradas pelo DOI-Codi durante os anos de chumbo. As conveniências políticas falaram mais alto do que o senso de justiça.
Se fosse um homem de princípios, Brilhante Ustra se rebelaria contra
aqueles que lhe ordenaram que cometesse crimes contra a humanidade e
depois se puseram a salvo, não carregando com ele o fardo do opróbrio.
Mas, de quem fez o que ele fez durante 1970/1974 só poderia esperar-se o
caminho tortuoso que preferiu trilhar: tentar convencer o Brasil
inteiro de que as vítimas é que eram os algozes e ele, um pobre coitado
sem culpa nenhuma no cartório.
Seus dois livros repulsivos, entretanto, atraíram contra ele a ira dos
justos. Porque são montados a partir das informações arrancadas dos
prisioneiros mediante as torturas mais cruéis, seja no próprio DOI-Codi,
seja nos aparelhos clandestinos da repressão, de onde não se saia vivo.
Era muita impudência utilizar o espólio de sua ignomínia para tentar
justificar-se.
Então, eis Brilhante Ustra, mais do que nunca, sendo visto pelos brasileiros como o torturador-símbolo da ditadura militar.
Mas, não serei tão injusto com ele como ele sempre foi com os outros:
afirmo, e assino embaixo, que seus superiores tiveram culpa ainda maior
pelas práticas desumanas e desonrosas do DOI-Codi, nessa que foi uma das
páginas mais vergonhosas da História do Brasil.