Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

A pressa governista

Quinta, 17 de outubro de 2013
Por Ivan de Carvalho
Depois de uma conversa demorada com a presidente Dilma Rousseff, Lula passou à direção nacional do PT a tarefa de fechar o mais depressa possível alianças em torno da candidatura da presidente à reeleição.
         Essa pressa é resultado, sobretudo, da mudança do cenário eleitoral com a decisão de Marina Silva de ingressar no PSB e, tudo indica, apoiar a candidatura do presidente nacional deste partido e governador de Pernambuco, Eduardo Campos, à sucessão de Rousseff.
         O governo Rousseff e o PT não esperavam esse novo cenário. Esperavam, sim, que graças ao golpe cartorial que – ajudado por um Tribunal Superior Eleitoral incapaz de sair da inércia e mais apegado à letra da lei do que ao espírito dela e à realidade, esmagou a tentativa de Marina Silva de criar o partido Rede Sustentabilidade a tempo de disputar por ele a Presidência da República – Marina se encolhesse, murchasse e se alheasse às eleições, dedicando-se a lamber as feridas. Era tudo que o governo e o PT queriam e do que praticamente tinham certeza.
         Fera ferida, no entanto, ela partiu para o contra-ataque. E cheia de razão, pois o ataque não fora honesto.  Surpreendeu o governo, o PT e toda a nação. Ingressou no PSB, partido no qual estava posta a candidatura de Eduardo Campos a presidente da República. A entrada de Marina cria para a candidatura de Eduardo Campos alguma necessidade de mudanças nas estratégias de alianças político-eleitorais (por exemplo, provocou o afastamento do deputado Ronaldo Caiado e praticamente de todos os setores do agronegócio dos quais Campos buscava se aproximar).
         Mas o resultado da conta de ganhos e perdas tem sinal fortemente positivo. A pesquisa Datafolha (não tenho dedicado maior atenção às pesquisas do Vox Populi nos últimos anos, pois este instituto, embora renomado no país, tem trabalhado amiúde para o governismo e é preferível louvar-se em instituto que não tem como clientes quaisquer dos interessados diretos nas pesquisas eleitorais e de opinião política) mostrou isso. E foi feita com um intervalo muito pequeno entre o anúncio do ingresso de Marina no PSB, com a aliança em torno da candidatura de Eduardo Campos, e a coleta de dados pelo Datafolha. Isto quase certamente significa que não houve tempo de medir na pesquisa todo o “adensamento” da candidatura do PSB a partir do anúncio do ingresso de Marina no partido.
         Daí entende-se a pressa de Lula – transmitida ao comando nacional do PT – em “fechar” alianças em torno da candidatura de Dilma. E o presidente nacional do PT, Rui Falcão, ainda na terça-feira, esteve com líderes do PMDB, PTB, PR e PP para antecipar a formação de palanques nos Estados, num esforço para isolar o PSB de Eduardo Campos. Sinal inequívoco de que a aliança Campos – Marina abalou os nervos no PT.
         A razão principal da pressa do PT em consumar alianças regionais? Parece evidente que o partido no poder teme movimentos no eleitorado (que podem ser induzidos por mil causas, previsíveis e imprevisíveis) que alterem uma configuração sucessória em que a confusão e a incerteza já foram introduzidas espetacularmente de maio ao final de junho. Em tais circunstâncias, aliados governistas de hoje poderiam mudar de lado, pois a perspectiva de poder é o mais forte atrativo e o maior fator de agregação.
Calmantes foram aplicados à sociedade, na forma de um polêmico “Programa Mais Médicos” e de uma notoriamente inconsistente blitz publicitária (o governo federal paga para anunciar, por exemplo, que 814 hospitais estão sendo construídos no país, mas não diz onde, nem fornece a lista. É segredo.). O ruído de fundo que desencadeou as manifestações de junho continuam presentes e com a mesma intensidade. Isto não é segredo: nada sério foi feito pelo governo para tirar do inferno ao qual haviam sido lançados os setores de saúde, segurança, educação, entre outros.
         Ah, uma prioridade se impôs: os estádios Padrão-Fifa para a Copa, cujos jogos a quase totalidade dos brasileiros vai ver pela televisão, o que de qualquer modo poderia fazer, fosse a competição realizada aqui ou em qualquer outro país.
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Este artigo foi publicado originariamente na Tribuna da Bahia desta quinta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.