Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Quem são os vândalos?

Quinta, 17 de outubro de 2013
Roberto Saturnino Braga e Paulo Metri *

No dicionário Michaelis pode-se ler que a palavra “vândalo” é oriunda do latim vandalus e, quando usada como um substantivo, tem os seguintes significados: 1) membro dos vândalos, povos bárbaros que devastaram o sul da Europa e se estabeleceram no norte da África; 2) por extensão, aquele que pratica atos de vandalismo; e 3) por extensão ainda, indivíduo que comete atos funestos às artes, às ciências e à civilização. Prestar atenção ao fato de que o significado é abrangente e engloba também o indivíduo que comete atos funestos à civilização, ou seja, por extensão, todos aqueles que não contribuem para ou que prejudicam o bem-estar da sociedade.

Então, nessa abrangência, não seriam vândalos aqueles meios de comunicação que propositadamente informam à população versões erradas de fatos ocorridos, torcendo a realidade e omitindo outras versões e opiniões diferentes? Não seriam vândalos aqueles que desviam recursos do setor público?

Também, não seriam vândalos os juízes que julgam acusados, não pelos fatos e provas, mas pela visão da corrente política da qual são seguidores?

Assim, não seriam ainda vândalos os políticos que fazem de seus mandatos instrumentos, não para a melhoria da condição de vida da sociedade, mas para satisfação de orgulhos e desejos materiais pessoais.

Não seriam vândalos os servidores públicos que esquecem o conteúdo público de suas atividades e se dedicam fortemente ao corporativismo?

Outrossim, não são vândalos aqueles que, de forma irracional, são acometidos de raivas e rancores extremados, sendo capazes de cometer agressões verbais e físicas?

Não são vândalos os que buscam reduzir ao máximo os salários e os benefícios sociais daqueles que empregam?

Não são vândalos os trabalhadores, que revoltados com supostas explorações patronais, depredam seus locais de trabalho? Não seria um ato de vandalismo a mídia quase nunca dar o microfone para as lideranças dos movimentos sociais e chamar sempre para opinar representantes do capital que nunca divergem e sempre se complementam?

A mídia, quando deixa de promover, sistematicamente, debates públicos sobre os diversos temas polêmicos, não estaria exercendo uma forma de vandalismo?

Não seriam vândalos os que entregam patrimônio público para grupos privados, principalmente estrangeiros? O leilão do campo de Libra, um patrimônio público incomum pela sua grandiosidade, não se enquadra em um ato de vandalismo?

São vândalos, sim, os que depredam bancos e estabelecimentos comerciais durante manifestações, mesmo que as injustiças sejam tantas que provoquem revolta.

É vândala, também, a polícia que exibe satisfação ao espancar e jogar bombas de efeito moral e spray de pimenta em manifestantes.

São vândalos os mandatários de cargos executivos eletivos que se negam a negociar com trabalhadores.

Como são vândalos os dirigentes de entidades que promovem as manifestações com o pensamento de que, “quanto mais quebra-quebra ocorrer, melhor”.

No entanto, aproveitar o vandalismo para criminalizar os movimentos sociais neste rico momento de expressão de sentimentos e reivindicações que vivemos é um erro profundo. Temos uma oportunidade incomum de crescimento da nossa sociedade. É necessário que cada grupo e cada cidadão façam neste fértil momento suas autoanálises, e, coletivamente, conquistemos um importante degrau superior na escala da conscientização política do povo brasileiro.
 
* Roberto Saturnino Braga é ex-senador pelo Rio de Janeiro e, bem como Paulo Metri, conselheiro do Clube de Engenharia
 
(Artigo veiculado pelo JB digital a partir de 16/10/13)