Domingo, 2 de novembro de 2014
Isabela Vieira - Repórter da Agência Brasil
Organizações
de direitos humanos, religiosos e movimentos da sociedade aproveitaram o
Dia de Finados, hoje (2), para lembrar os mortos e desaparecidos do
regime militar, entre 1964 e 1985, além de vítimas de tortura e morte
sumária pelo Estado, como o caso Amarildo de Souza. O ajudante de
pedreiro foi torturado e morto por policiais militares da Unidade de
Polícia Pacificadora (UPP), da Rocinha, na zona sul da cidade do Rio de
Janeiro, em 2013.
A homenagem às vítimas ocorreu com uma
celebração ecumênica, no Cemitério de Ricardo de Albuquerque, na zona
norte, onde está o monumento pelo Grupo Tortura Nunca Mais em memória a
14 militantes enterrados ali. No local, durante o regime, havia uma vala
onde as ossadas dos ativistas foram enterradas, misturadas com os
restos mortais de 2 mil indigentes, de acordo com a presidenta do grupo,
Victória Grabois, que teve acesso a documentos oficiais.
Segundo
ela, o ato também cobra a abertura dos arquivos da ditadura para que
sejam revelados os paradeiros de todos os mortos e desaparecidos, cerca
de 500 pessoas. “Tudo o que temos até hoje são informações pontuais.
Levamos anos para saber [do paradeiro] de um, mais não sei quantos anos
para saber de outro”, disse. “O Estado precisa ter a coragem de abrir os
arquivos, para que saibamos o que aconteceu e interrompamos esse ciclo
de violência, consequência da ditadura, com punição para quem matou
torturou e ocultou cadáver”, completou.
Ao cobrar a
responsabilização de agentes do Estado envolvidos nos crimes da ditadura
militar, as organizações de direitos humanos apostam em mudanças nas
instituições militares hoje, defende a pedagoga Fátima Silva, do
Movimento Candelária Nunca Mais – criado em referência aos oito jovens
mortos por policiais militares nas proximidades da Igreja da Candelária,
no Rio, em 1993.
“Percebemos que a violência, a falta de
políticas públicas para as crianças e os adolescentes, o preconceito
social e o racismo, resultam em várias mortes, sobretudo de jovens
negros de favelas”, disse Fátima que, durante a cerimônia, citou mais de
dez chacinas no estado do Rio.
No ato ecumênico, parentes de
jovens mortos por PMs também cobraram ações para conter a violência do
Estado. Mãe do adolescente Johnata de Oliveira de Lima, de 19 anos,
baleado em maio, em Manguinhos, na zona norte, Ana Paula Gomes de
Oliveira criticou a truculência dos agentes e a banalização de mortes
sumárias dentro das comunidades pobres.
Ana Paula também
desabafou que a estratégia de desqualificação das vítimas, pela Polícia
Militar, que tenta associar os jovens ao tráfico de drogas, segundo ela,
é perversa, porque passa a ser repetida pela mídia e não enfrenta a
raiz do problema. “A imprensa deveria ter o cuidado de não reproduzir a
versão da polícia sem o conhecimento dos fatos. No caso do meu filho,
foi alegado vítima em confronto, mas um exame de [resíduo de] pólvora
diria que Johnata não portava nenhuma arma. Tinha ido deixar a namorada
em casa”, desabafou.
Os acusados pelas mortes de Amarildo e
Johnata estão sendo julgados pelo Tribunal de Justiça Estado do Rio de
Janeiro. A Justiça já condenou os envolvidos na chacina da Candelária e
colocou um dos sobreviventes em programa de proteção às testemunhas,
fora do país.