Quarta,
12 de agosto de 2015
"A Agenda
Brasil, plano de recuperação econômica divulgado hoje pelo
Governo Federal, é uma proposta que destroi o Brasil antes de salvá-lo",
afirma o Greenpeace, 11-08-2015.
Segundo o movimento, "é impossível salvar o Brasil
destruindo o Brasil".
Eis o comentário.
A Agenda Brasil, plano de recuperação econômica
divulgado hoje pelo Governo Federal, é uma proposta que destrói o Brasil antes
de salvá-lo. Conjunto de ONGs lança manifesto rechaçando
medidas.
Lançada nessa terça-feira pelo Governo Federal e senadores
da base aliada, a Agenda Brasil é
um pacote de 28 medidas para combater a crise. No entanto, a iniciativa acaba
por revelar a incapacidade do governo de formular um plano nacional que
enxergue o meio ambiente, não como entrave, mas como alavanca para desenvolver
e modernizar o Brasil.
O plano embutido na Agenda Brasil é
fazer mais do mesmo. O meio ambiente à reboque da economia e a inclusão social,
do aumento do consumo e não pela garantia dos direitos básicos aos cidadãos. Em
reação ao documento, conjunto de organizações da sociedade civil, entre elas o
Greenpeace, divulgou manifesto rechaçando as medidas apresentadas.
O governo federal mais uma vez perde a chance de fazer
diferente. Mostra não conseguir enxergar oportunidades na crise. Ao invés de
repensar os rumos do País, continua com a implantação de programas
emergenciais, que são desenhados no atropelo, porém que definem as condições de
vida da sociedade por muitas décadas. É a lógica de empurrar o problema com a
barriga, adotando medidas com impacto negativo na população e no meio ambiente.
Já passou da hora de pensar um modelo de desenvolvimento
que respeito a diversidade socioambiental do Brasil, levando em conta os mais
diversos recursos que o País dispõe. É o momento de mostrar que a floresta em
pé é mais valiosa que a floresta no chão; é a hora do desmatamento zero. É o
momento de reconhecer que quem mora longe dos centros urbanos também é cidadão
brasileiro e de entender que, quando a água da torneira seca em casa, é por que
a mata ciliar que protege rios e a floresta foram destruídas. É impossível
salvar o Brasil destruindo o Brasil.
Pontos críticos
Dividida em três áreas, “Melhoria do Ambiente de Negócios
e Infraestrutura”, “Equilíbrio Fiscal” e “Proteção Social”, aAgenda Brasil contém
diversos pontos críticos em relação ao meio ambiente, que segue sendo visto
pelo governo e pelo setor privado como um empecilho para o desenvolvimento
brasileiro.
As terras indígenas são colocadas dessa maneira, como
entraves para a recuperação da crise, e propõe-se a revisão dos marcos
jurídicos que as regulam para acelerar as obras de infraestrutura. A proposta
tem o claro objetivo de transformar essas terras em locais de atividades
produtivas, ou seja, torná-las rentáveis aos olhos da União. Não se leva em
conta, como de costume, os povos tradicionais que alí habitam, suas culturas e
hábitos, e muito menos os serviços prestados por estes territórios preservados,
como a regulação climática, a produção de chuvas e a manutenção da
biodiversidade, entre outros.
A proposta também quer incentivar a mineração a partir da
implementação de um novo marco jurídico para o setor. Isso vai gerar uma
corrida, sem regra conhecida e com potencial dramático de destruição, às
riquezas que hoje pertencem à União.
Outro ponto de atenção é que a Agenda
Brasil estipula a
revisão da legislação de licenciamento ambiental em zonas costeiras, áreas
naturais protegidas, unidades de conservação e cidades históricas. Além disso,
pede por uma “PEC das Obras Estruturantes”, pela qual os
processos de licenciamento ambiental referentes às obras do PAC (Programa
de Aceleração do Crescimento) e dos programas de concessões
seriam simplificados.
Enquanto a Agenda Brasil tenta
enfraquecer o processo de licenciamento ambiental, a presidente discursa
apresentando o Programa
de Investimento em Energia Elétrica, enaltecendo os esforços do
governo no que tange ao licenciamento. O problema é que a própria diz que “as
hidrelétricas foram feitas com cuidado e rapidez” e, quando olhamos para a
realidade, especialmente para as usinas do Rio Madeira e
para Belo
Monte,no Xingu, vemos no que ‘rapidez’ se traduz: impactos
socioambientais graves e irreversíveis, sentidos principalmente pela população
mais pobre.
A marcha da insensatez agora avança sobre o Rio
Tapajós, no Pará, com o governo tentando empurrar goela abaixo
de comunidades ribeirinhas e povos indígenas a construção da hidrelétrica
de São Luiz do Tapajós.
O Procurador do Ministério Público Federal, João
Akira, em artigo publicado na mais recente edição da Revista
Greenpeace, pontua que os problemas do licenciamento ambiental
são de outra natureza e não dizem respeito à velocidade da marcha
procedimental, mas à sua qualidade e à decisão política de investimento na sua
eficácia. “O que se verifica não são essencialmente falhas normativas, mas
défice democrático e deficiências na condução dos procedimentos, o que tornam
injustificáveis muitas das decisões tomadas. O exercício do poder político e a
expansão do poder econômico já não se satisfazem com o sacrifício dos há muito
sacrificados, agora querem que seja feito tudo muito rápido”, afirmou Akira.
Acelerar o licenciamento destes projetos tende a expor a
população aos risco do planejamento ruim, abre a porta para a já endêmica
indústria de corrupção comum as estas obras. Taí a Lava-Jato com uma cachoeira de exemplos
lamentáveis. Estes grandes projetos, como as hidrelétricas na Amazônia, são
sempre acompanhados de grandes impactos ambientais – muitos deles
irreversíveis. São obras que atingem áreas de preservação permanente, derramam
óleo no mar, que contaminam e represam os rios, deslocam milhares de pessoas e
contribuem para o desmatamento.
Público ou privado?
Como se não bastasse, o pacote de medidas ainda pede a
revisão do marco regulatório das concessões, para favorecer os investimentos
privados em projetos de infraestrutura. São aqueles projetos de uso público e
comum que o Estado transfere a execução para o setor privado. Ou seja, são
todos aqueles projetos que deveriam atender à população brasileira e não à
lógica econômica financeira. Isso está diretamente ligado com outro ponto da
tal “agenda”, que pede a implantação de uma "Avaliação
de Impacto Regulatório", para que o Senado possa
dimensionar as consequências das normas dessas concessões nos investimentos em
infraestrutura. O que se esquece, uma vez mais, é que seria necessário avaliar
o impacto também na vida das pessoas.
Em resumo, a Agenda Brasil mais
uma vez se fortalece o discurso de enfraquecer o princípio da precaução, das
salvaguardas ambientais e os direitos coletivos. Enfraquece sobretudo uma
alternativa para o desenvolvimento do Brasil que concilie produção e
preservação, desenvolvimento com transparência e respeito aos recursos
naturais, econômicos e humanos. Por tudo isso, com a Agenda
Brasil o governo
reenforça sua torpe miopia.