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(Millôr Fernandes)

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2019

PGR recorre de decisão do governo Temer que permitiu continuidade de contrato de exploração de satélite brasileiro por empresa americana; lançado em maior de 2017 o equipamento tem também função militar

Quarta, 6 de fevereiro de 2019
Do MPF
Em documento enviado ao Supremo, Raquel Dodge destaca que TCU confirmou que contrato entre Telebras e Viasat tem fortes indícios de ilegalidade
A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, recorreu de decisão da ministra Cármen Lúcia que derrubou a liminar que impedia a continuidade do contrato entre a Telecomunicações Brasileiras (Telebras) e a empresa americana Viasat para a exploração do Satélite Geoestacionário Brasileiro de Defesa e Comunicações Estratégicas (SGDC). Em agravo de instrumento encaminhado ao Supremo Tribunal Federal (STF), a PGR argumentou que o Tribunal de Contas da União (TCU) identificou graves irregularidades na contratação. A avaliação é de que o contrato representa risco de lesão aos cofres públicos, e que isso se torna ainda mais grave diante do fato de que a parceria já dura um ano.
Lançado em maio de 2017, o equipamento tem duas funções: a militar (Banda X), que foi cedida ao Ministério da Defesa, e a civil (Banda Ka), destinada à Telebras para a prestação de serviços de conexão à internet no modelo banda larga. Voltada para o interesse público, a Banda Ka deve atender às demandas da Administração Pública, em especial aos projetos nas áreas de educação e saúde. O contrato firmado pela Telebras permite que a Banda Ka seja integralmente explorada pela empresa norte-americana.
A PGR destacou que, embora tenha detectado vícios, o TCU entendeu não ser o caso de integral anulação do contrato. Isso por que a anulação da parceria acarretaria severos prejuízos para a execução de uma importante política pública. A Corte de Contas determinou, então, o monitoramento do contrato e a redução do valor previsto contratualmente a ser pago pela Telebras à Viasat, pela utilização de equipamentos para promover um reequilíbrio financeiro. O Tribunal estabeleceu ainda anulação e retificação de cláusulas do contrato.
“Os sinais de disparidade econômico-financeira – com diferenças de lucratividade apontadas pelo TCU que denotam estar a empresa americana obtendo vantagem significativamente superior à Telebras – tornam a parceria ainda mais questionável e mais premente a necessidade de intervenção jurisdicional para readequação das condições econômicas e reequilíbrio da vantajosidade do acordo e consequente preservação dos recursos públicos”, ponderou a procuradora-geral em um dos trechos do documento.
Raquel Dodge destacou, ainda, outra irregularidade constatada pelo TCU e que já havia sido mencionada em parecer da própria Procuradoria-Geral da República: o possível comprometimento do alcance dos objetivos do Programa Nacional de Banda Larga (PNBL). O contrato, no que se refere à prestação de serviços de infraestrutura ou para usuários finais, utilizando o satélite brasileiro, condicionou a atuação da Telebras a uma aprovação prévia da Viasat. A avaliação é de que o requisito imposto representa risco relevante, já que submete a estatal de forma desarrazoada ao particular e pode gerar um monopólio na exploração dos recursos do satélite, por parte da Viasat, em localidades onde inexista oferta adequada desses serviços, afrontando, assim, a principal meta do PNBL de massificar a internet banda larga no Brasil.
As duvidosas circunstâncias da contratação, o enorme volume de recursos públicos envolvidos e as irregularidades e desequilíbrio financeiro já constatados pelo Tribunal de Contas da União impõem a intervençãdo Supremo Tribunal Federal, para que, cautelarmente, minimizem-se os prejuízos ao erário e sejam preservados a lisura da ação administrativa e o patrimônio público”, argumenta Raquel Dodge ao solicitar a decisão sejrevista. A PGR pede ainda, caso o agravo não seja provido, que o recurso seja submetido ao colegiado do STF.
O processo – O contrato firmado pela Telebras e Viasat foi contestado por duas empresas (Via Direta Telecomunicações por Satélite e Internet e Rede de Rádio e Televisão Tiradentes), que ajuizaram ação na Justiça estadual. Elas conseguiram liminar que suspendeu a contratação. A União manifestou interesse de ingresso nos processos, e o caso foi deslocado para a Justiça Federal. A juíza da 1ª Vara da Seção Judiciária do Amazonas ratificou a liminar concedida pela Justiça estadual e, em julgamento de recurso apresentado pela União, o presidente do Tribunal Regional Federal 1ª Região (TRF1) também manteve os efeitos da decisão de primeira instância. A União então recorreu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), que encaminhou o processo ao STF, por entender que o caso envolve tema constitucional.