Terça, 1 de outubro de 2011
Da Agência Senado
A Conferência Nacional dos Bispos do
Brasil (CNBB) e outras entidades que integram o Comitê Brasil em Defesa
das Florestas apresentaram aos senadores, nesta segunda-feira (31),
sugestões ao projeto de reforma do Código Florestal (PLC 30/11), para restringir atividades em Áreas de Preservação Permanentes (APPs) e de reserva legal.
A
principal modificação sugerida diz respeito a artigo do projeto que
autoriza a manutenção de atividades agrossilvopastoris, de ecoturismo e
de turismo rural existentes em APPs até 22 de junho de 2008 - data da
edição do Decreto 6.514/2008, que determina punições para crimes contra o
meio ambiente.
Para Raul do Valle, do Instituto
Socioambiental (ISA), a data é "inconcebível", uma vez que a última
modificação na delimitação de APPs foi em 1986. Ele sugeriu que, pelo
menos, seja acolhida emenda do senador Aloysio Nunes (PSDB-SP),
apresentada quando da tramitação do projeto na Comissão de Constituição e
Justiça (CCJ), estabelecendo como marco temporal o dia 24 de agosto de
2001, data da edição da Medida Provisória 2.166-67, que alterou regras
para áreas protegidas.
A emenda
foi rejeitada pelo relator na CCJ, Luiz Henrique da Silveira (PMDB-SC).
Atualmente, o projeto tramita nas comissões de Ciência e Tecnologia
(CCT) e Agricultura (CRA), onde também é relatado por Luiz Henrique. Na
semana passada, o senador apresentou seu substitutivo nessas comissões e
manteve 2008 como marco temporal para a regularização de atividades em
APPs.
Segundo Raul do Valle, sob argumentos em
defesa de cultivos históricos, como de café, em Minas Gerais, e de uva,
no sul do país, poderão ser consolidadas atividades insustentáveis, como
as pastagens nas margens dos rios e nos morros.
O
dirigente do ISA também rebateu argumento relacionado ao custo da
recuperação das áreas de preservação, citando pesquisas da Escola
Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP), as quais indicam
práticas simples de recuperação da vegetação, a partir do isolamento da
área desmatada.
Desastres naturais
No
debate, o secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
(CNBB) e bispo auxiliar da Arquidiocese de Brasília, Dom Leonardo
Steiner, ponderou que a preservação de APPs também é essencial para
reduzir consequências de desastres climáticos e mesmo para evitar
enchentes e deslizamentos de terras.
Ele disse esperar que, na construção do novo código, a agenda econômica não fique acima da agenda ambiental.
-
A natureza tem reclamado muito desse modo de exploração. Não é por nada
que temos tido no Brasil tantas enchentes, inundações e encostas
descendo - disse o bispo, ao defender que o novo código tenha uma
preocupação ética, que garanta o futuro do país.
Comitês de bacias
Representante
da SOS Mata Atlântica, Mario Mantovani defendeu a participação dos
comitês de bacias hidrográficas nas discussões sobre o Código Florestal.
Segundo ele, esses comitês não vêm sendo ouvidos. Compostos por membros
do governo e da sociedade civil, os comitês de bacias hidrográficas
fazem parte do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos.
Mantovani
argumentou que não se deve regularizar a ocupação de margens de rios
quando ainda for possível recuperar esses locais. E afirmou que "as
conquistas da Lei da Mata Atlântica [Lei 11.428, de 22 de dezembro de
2006] deveriam ser levadas para o Código Florestal". Essa lei trata da
utilização e da proteção da vegetação nativa do Bioma Mata Atlântica.
Comunidades indígenas
Representante
da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Rosane de Matos
disse que os indígenas também precisam ser ouvidos, para que não se faça
com pressa "uma lei que deixe de fora populações que parecem estar
invisíveis ao Estado".
No debate, o senador
Vicentinho Alves (PR-TO) observou que grupos indígenas do seu estado
estão "bem antenados" e acompanham a discussão em torno da nova lei
florestal. O parlamentar relatou preocupação das comunidades indígenas
cujas áreas são cortadas pelo rio Xingu, uma vez que as nascentes ficam
fora da reserva.
O representante do Conselho
Indigenista Missionário (Cimi), Cleber Busato, denunciou a invasão por
madeireiros, no Maranhão, das terras onde vivem os índios Awá Guajá, que
estariam isolados e "sendo caçados".
- Essas
terras estão sendo invadidas e desmatadas ilegalmente. O Código
Florestal não pode legitimar crimes e ilegalidade - disse Busato.
Agricultura familiar
O
tratamento diferenciado para a agricultura familiar no novo Código
Florestal foi defendido por todos os convidados. No início da audiência
pública, Dom Leonardo Steiner lembrou preocupação da CNBB com esse
segmento, "que vive da terra" e nem sempre consegue atender às
exigências da legislação ambiental.
No mesmo
sentido, José Batista de Oliveira, representante do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e da Via Campesina, enfatizou que a
preservação de florestas não pode ser vista como conflitante com a
produção de alimentos. Ele defendeu mudanças no modelo agrícola do país,
para que seja mais sustentável e menos excludente.
No
debate, o senador Blairo Maggi (PR-MT) reafirmou sua posição de defesa
dos pequenos produtores e da manutenção das atividades desenvolvidas
nessas propriedades, mesmo que em áreas de preservação. Ao comentar o
assunto, Raul do Valle disse considerar que o tratamento diferenciado
deveria ficar restrito aos agricultores familiares, em vez de ser
concedido a todas as propriedades com até quatro módulos fiscais, como
previsto no projeto.