Sem se
esquivar de polêmicas institucionais, o conselheiro Renato Rainha atribui a
crise na rede pública de Saúde à falta de competência dos gestores públicos
Francisco Dutra e Millena Lopes — Jornal de Brasília
Sobra dinheiro e falta gestão na Saúde Pública do Distrito
Federal. Desta forma o presidente do Tribunal de Contas do DF (TCDF),
conselheiro Renato Rainha, avalia um dos pontos mais sensíveis da máquina
pública brasiliense, cujas fragilidades castigam a população diariamente. Sem
se esquivar de polêmicas institucionais, Rainha atribui a crise na rede
pública de Saúde à falta de competência dos gestores públicos. Segundo o
conselheiro, o Tribunal fará neste ano uma auditória constante do sistema de
Saúde a partir de março. De olho nas contas públicas, Rainha alerta para o sucateamento
da Segurança Pública, pois ao longo dos últimos anos o investimento do Fundo
Constitucional no setor tem diminuído percentualmente de forma constante. No
ano passado, o nome de Rainha passou a ser citado como um potencial candidato
ao Palácio do Buriti em 2018. Sobre este assunto, o conselheiro que já ocupou o
cargo de deputado distrital desconversa, mas deixou uma frase solta no ar:
“Quando me aposentar do tribunal, eu não vou ficar parado em casa”.
Nas eleições de 2014, candidatos diziam
que o problema da Saúde do DF não era falta de dinheiro, mas sim de gestão. O
senhor compartilha desta opinião?
Perfeitamente. Uma auditoria que nós fizemos nas UTIs, no
ano de 2013. De janeiro setembro, de cada três pessoas que procuraram a
UTI, duas não encontraram. Só que nesse período nós desperdiçamos quase 10 mil
dias-leitos de UTI por falta de gestão. Se esses 10 mil dias-leitos tivessem
sido bem gerenciados, quantas pessoas que bateram às portas das UTIS poderiam
ter o atendimento e ter suas vidas salvas? E foi gasto com pessoas. Porque
pessoas que tinham alta hospitalar ficavam em média nove dias na UTI tomando
vaga daquele que precisava? Isso é falta de gestão. E como esse fato, nós já
vimos muitos outros. Em todas as áreas, não apenas na Saúde. Nas auditorias, o
que o Tribunal faz? Ele aponta as ilegalidades e irregularidades. Mas o mais
importante: aponta o caminho para ser corrigida essa ilegalidade ou essa
irregularidade.
Quais são as prioridades do TCDF
para 2016?
Nós vamos cobrar neste ano, uma auditoria de resultado e
eficiência na área de Saúde. Esse sofrimento que a população está tendo na área
de Saúde tem que acabar. E o Tribunal de Contas do Distrito Federal, junto com
o Tribunal de Contas da União e os Tribunais de Contas dos estados, isso é um
trabalho que é feito nacionalmente, nós vamos fazer uma auditoria de eficiência
na área de Saúde. E nós vamos cobrar isso no Brasil inteiro para que a
população deixe de sofrer com esse descaso na área de Saúde. Isso é um absurdo.
Eu gosto de ir às unidades de serviços públicos e já fui em muitas na área de
Saúde à noite. Dá vontade de chorar. Realmente é algo extremamente degradante.
O Tribunal vai cobrar eficiência nessa área.
Como vai ser isso? E quando
começa?
Nós temos vários auditores especializados nessa área. Nós
já fizemos os questionamentos com os próprios servidores, gestores e o pessoal
da governança da área de Saúde. E já informamos a eles os caminhos que
nós vamos tomar para apurar. Vamos apurando as irregularidades e determinando a
correção. E assim que o Tribunal fizer a determinação, com um prazo eu vou
convocar a governança de Saúde para que eles nos informem “o que foi feito”; “o
que não foi feito” e; “porque não foi feito ainda”. É um acompanhamento completo,
concomitante, rigoroso, com uma equipe altamente especializada para
tentar mudar essa questão na área de Saúde no . Estamos fechando as equipes. No
começo de março elas já estarão em campo.
O governo estendeu o estado de
emergência na Saúde, que implica dispensa de licitações e uma série de etapas
para compras. Como o TCDF avalia isso?
Bom, que a Saúde está em estado de emergência todo mundo
sabe. O fato de o governo declarar o estado de emergência e de poder
flexibilizar algumas regras de aquisição, não significa que o Tribunal vai
fiscalizar menos as despesas na área de Saúde. Muito pelo contrário. Quando se
flexibiliza regras, o Tribunal fiscaliza mais. E é isso que nós estamos
fazendo. E vamos fazer isso de forma muito rigorosa e tempestiva.
Com relação ao estado de
emergência, já foi identificada alguma irregularidade nestes meses?
Não. Nós estamos ainda com auditorias e inspeções em
andamento. Certamente que for concluída alguma inspetoria ou auditoria e for
identificada alguma irregularidade, nós vamos dar o contraditório e a partir
daí nós vamos fazer o julgamento. Muitas coisas. quando nós identificamos no
início, a gente consegue suspender cautelarmente. Para isso a gente acompanha
os editais de licitação. Muitas vezes a gente suspende, exatamente para evitar
um dano, para evitar que o patrimônio público sofra um prejuízo. Porque depois
que ele sofre um prejuízo é muito difícil resgatarmos esse dinheiro. Nós
estamos vendo o que acontece na Petrobrás. Quanto dinheiro está sendo colocado
de volta para a Petrobrás? Mas quanto recursos não serão mais alcançados?
Nesse sentido, muito gestores
públicos, aberta e veladamente, se queixam da postura do TCDF. Como o senhor
responde a esses gestores?
Eu faço um desafio a eles. Que mostrem um processo em que
o Tribunal atuou determinando a suspensão de uma licitação ou determinando a
suspensão de um pagamento que não houvesse uma irregularidade gravíssima. Eu
deixo aqui o desafio. Vamos colocar a coisa objetivamente: Qual foi o processo
em que o Tribunal atuou em que não havia um motivo justo para uma decisão
rigorosa do Tribunal? Que venham as pessoas e mostrem.
Como o Tribunal enxerga os gastos
do governo na Segurança Pública?
O que nós notamos é que percentualmente o governo vem
gastando em segurança, a cada ano, parcela menor do Fundo Constitucional.
Constatamos que a área da Segurança está mesmo sucateada. Aí eu estou falando
da Polícia Civil, Polícia Militar e Corpo de Bombeiros. Falta pessoal, falta
material. É preciso, sim, investir em segurança. É preciso, sim, aumentar o
efetivo. Para que haja um controle rigoroso um combate efetivo à criminalidade
no Distrito Federal. Nós temos as melhores polícias do País e uma das melhores
do mundo. A Polícia Civil do Distrito Federal, nossa Polícia Militar e o Corpo
de Bombeiros são instituições reconhecidas internacionalmente. No Brasil são as
melhores, de longe. São profissionais altamente qualificados. Agora, precisa-se
de mais efetivo e de melhores condições de trabalho.
O governo Rollemberg propagou que
teve um começo marcado por uma crise financeira. Junto a isso existe a crise
nacional, mundial. Diante das contas, como o senhor avalia a performance do
governador?
Olha eu vejo que do ponto de vista da questão orçamentária,
financeira, o governo se esforçou muito para colocar os gastos
governamentais dentro da Lei de Responsabilidade Fiscal. Ele recebeu uma dívida
muito grande do governo anterior. E além disso ele tem uma crise, que não é
apenas do Distrito Federal. É uma crise nacional e até mundial. Vários países
estão passando por uma crise semelhante a que nós estamos passando. Então, noto
esse esforço da equipe da governança. Até porque eu recebi por diversas vezes
em audiências a equipe da governança, sempre procurando colocar as contas
governamentais dentro do que a Lei de Responsabilidade Fiscal determina. Ou
seja, que só se gaste aquilo que realmente será arrecadado.
Falando em LRF, o GDF estourou os
limites no ano passado. Como o TCDF está vendo essa situação? As contas do
ex-governador Agnelo Queiroz serão julgadas neste ano?
O Tribunal de Contas do Distrito Federal está analisando
essa situação. Os gestores responsáveis pelo governo anterior estão ainda
apresentando a defesa. O Tribunal ainda não tem números fechados e não tem um
posicionamento fechado. O relator é o conselheiro Inácio Magalhães Filho. Ele
está conduzindo esse processo da melhor maneira possível, respeitando o
contraditório e a ampla defesa. O Tribunal julgará se o governo anterior
realmente cumpriu ou não a Lei de Responsabilidade Fiscal. Se ele
cumpriu, ótimo. Se descumpriu, as penalidades são severas. A perspectiva
é que o julgamento ocorra nesse primeiro semestre. Até julho, acredito
que vamos votar as contas do governo referente à 2014.
O julgamento das contas de Agnelo
estava previsto para agosto do ano passado. Por que quase um ano de
atraso?
No primeiro momento porque o relator, que era o
conselheiro Paulo Tadeu, por problema de saúde, teve que deixar a
relatoria. O novo relator assumiu: o conselheiro Inácio Magalhães. E ele tem
que avaliar uma quantidade é imensa de documentos. Além disso,
temos que respeitar o contraditório e a ampla defesa. E o Tribunal
respeita isso até para evitar alguma ação de nulidade. O julgamento das contas
anuais do governo ocorre em duas fases, uma técnica e outra política. O
Tribunal fará o julgamento eminentemente técnico. O julgamento político será na
Câmara Legislativa. O ex-governador Agnelo Queiroz pediu prazo para a
defesa e depois a própria Procuradoria do Distrito Federal do atual governo
também pediu porque não havia entregue todos os documentos.
O governo ultrapassou a LRF e
diversas categorias pedem a contratação de concursados. A LRF impede o governo
de contratar quem?
O governo fez uma consulta ao Tribunal no começo do ano,
perguntando o seguinte: tendo em conta que o limite prudencial da Lei de
Responsabilidade Fiscal está extrapolado, se poderia fazer nomeação para as
áreas de Saúde e Educação. E o Tribunal respondeu incluindo a área de Segurança.
Diz que nesses casos, na área de Saúde, Segurança e Educação, por serem
atividades que a própria Lei de Responsabilidade Fiscal colocou como
prioritárias, ele podia fazer nomeação para as vacâncias. Se tivesse que fazer
algum corte, que cortasse em outras áreas. Mas as áreas de Saúde, Segurança e
Educação não poderiam ficar prejudicadas.
O seu nome é cotado como o de um
potencial candidato para o governo em 2018. Existe uma possibilidade de Renato
Rainha voltar à Casa Legislativa ou disputar a vaga de governador?
Com relação ao futuro, eu estou muito feliz no Tribunal,
do ponto de vista da minha atividade profissional. Eu me sinto extremamente
realizado, extremamente útil. Mas é lógico que no futuro nós podemos pensar em
outras atividades. Eu não penso agora em qualquer atividade política no
momento. Eu quero neste momento é concluir o meu mandato de presidente que vai
até o dia 31 de dezembro deste ano. E eu pretendo concluir da melhor maneira
possível. Quando eu aposentar — e eu não sei quando eu vou aposentar, pois
nunca pedi a contagem de tempo —, quando eu aposentar, dizia, certamente eu não
vou colocar um pijama e eu não vou para casa. Ou eu vou para a área política ou
eu vou para a faculdade dar aula, que é uma coisa que gosto muito. Ou vou advogar.
Mas ficar parado eu não vou.
Mas o senhor tem sido sondado.
Sim. Eu tenho sido procurado por partidos políticos e eu
tenho sido abordado na rua. Nesse final de semana, eu estive na Feira de
Vicente Pires e várias pessoas me pediram para voltar para a política. E recebo
esse carinho com muita alegria. Mas explico para as pessoas que a minha função
no Tribunal também pode ajudar a cidade. Você ajuda a cidade não só na
atividade política. Ajuda no Ministério Público, no Judiciário, na Polícia, na
atividade médica. E me sinto muito bem no Tribunal de Contas.
Agora… Feira é um lugar em que
candidato costuma andar.
Olha, eu ando em feira. Fui candidato a primeira vez em
94. E eu já andava em feira há muitos anos.