Por Luciana Genro
Esta semana encerrou-se com a votação da Medida Provisória 665, que dificulta o acesso ao seguro desemprego para milhões de trabalhadores, justamente em um momento que, todos sabem, o desemprego vai aumentar. A perversidade é inacreditável. Ao mesmo tempo em que aplica uma política econômica que vai aumentar o desemprego, o governo propõe uma nova legislação para deixar milhões de novos desempregados sem nenhum auxílio. A bancada do PT votou praticamente unida a favor desta medida cruel. A simbologia que esta política constrói é inegável. Para quem ainda não havia percebido, ficou evidente que o PT passou para o outro lado.
Esta semana encerrou-se com a votação da Medida Provisória 665, que dificulta o acesso ao seguro desemprego para milhões de trabalhadores, justamente em um momento que, todos sabem, o desemprego vai aumentar. A perversidade é inacreditável. Ao mesmo tempo em que aplica uma política econômica que vai aumentar o desemprego, o governo propõe uma nova legislação para deixar milhões de novos desempregados sem nenhum auxílio. A bancada do PT votou praticamente unida a favor desta medida cruel. A simbologia que esta política constrói é inegável. Para quem ainda não havia percebido, ficou evidente que o PT passou para o outro lado.
Quero chamar a atenção para o
fato de que o processo que ocorre aqui no Brasil com o PT não é muito diferente
do que ocorreu na Europa com os partidos da esquerda tradicional. A crise de
2008 desnudou esta esquerda rendida, que se jogou na implementação dos ajustes
contra o povo, idênticos aos aplicados pelos partidos da direita tradicional.
Assim eles foram se revezando no poder e seguindo as políticas em defesa do
capital. O descontentamento do povo cresceu em todos os países, o que fez com
que quem governava perdesse as eleições. A esquerda tradicional perdeu para a
direita, e a direita perdeu para a esquerda tradicional. Mas a alternância é
fictícia, pois o modelo econômico aplicado é o mesmo.
Mas não foi assim em todos os
países. Na Grécia o povo empobrecido foi às ruas, fez greves e protestos,
ocupou as praças. Como resultado, depois de muita crise política durante a qual
se alternaram os partidos da esquerda e da direita tradicionais, ganhou a
Syriza. Ganhou sem alianças espúrias, sem financiamentos suspeitos, sem abrir
mão do seu programa, cujo eixo é não aceitar mais o ajuste nas costas do povo.
Não sabemos ainda se vão conseguir resistir às pressões para que cedam, mas
estão tentando.
Na Espanha, onde também esta
alternância fictícia vinha ocorrendo, vieram as lutas dos Indignados que
tomaram as ruas e praças em grandes protestos, e surgiu o Podemos, que hoje é uma
força política poderosa e pode vencer as próximas eleições. O Podemos tem o
mesmo eixo programático da Syriza: não ao ajuste, que os de cima paguem pela
crise. Na Grécia e possivelmente na Espanha se abre a possibilidade de
construir outro caminho.
Voltemos ao Brasil. Que estamos
diante de uma das mais graves crises política e econômica, é quase um consenso.
Ambas se expressam de forma muito contundente. O governo Dilma acabou, mas
ainda tem quatro anos pela frente. Os que se apavoraram com as manifestações
impulsionadas pela direita já perceberam que a ameaça de impeachment funcionou,
na verdade, como uma arma apontada contra uma presidente que, depois de
anunciar um programa que parecia mais o do seu adversário, viu erodir sua base
social. Com esta cartada o PSDB tratou de garantir que ela se curve aos
interesses capitalistas de modo cabal e irreversível. E conseguiu. O PL das
terceirizações é fruto desta fraqueza do governo e do interesse do PMDB em
sinalizar à burguesia seu compromisso em garantir o crescimento da taxa de
lucro através do rebaixamento do custo da mão de obra. Isto é, através de uma
exploração ainda mais brutal da classe trabalhadora.
Eu já havia dito, e acho que
agora fica mais claro ainda, que nenhum setor da burguesia deseja o impeachment,
pois traria uma maior instabilidade política, o que dificultaria ainda mais o
ajuste. O que a burguesia quer, e aparentemente vai conseguir, é a aplicação do
ajuste que garanta o pagamento de juros da dívida pública, assim como na
Europa. Para alguns parece clichê, mas é a pura verdade. Basta ver que só
aumento da taxa de juros desde as eleições elevou as despesas do governo em R$
45 bilhões ao ano. Nesta despesa não há ajuste, há reajuste. E os arautos da
necessidade de “equilibrar” o orçamento nada dizem sobre isso.
O PSDB esperneia, por que quer
ele mesmo governar, mas é “responsável” o suficiente para saber que não pode
colocar seus interesses políticos acima das necessidades do capital. Por isso
não querem derrubar a Dilma, querem sim que ela aplique o ajuste, garanta o
superávit primário para pagar os juros da dívida e que o descontentamento
popular os leve a vencer as próximas eleições. O PT, ao mudar de lado, permitiu
que o PSDB se fizesse passar por defensores das mudanças desejadas pelo povo.
Igualzinho ao que ocorreu na Europa. Somado a tudo isso, a corrupção, que levou
para a cadeia os dois últimos tesoureiros do partido, além de um ex-presidente
da legenda e de um dos principais ministros do primeiro governo de Lula. Um
fenômeno de desmoralização desta velha esquerda que expressa no terreno
político o que o ajuste expressa no terreno econômico: a total capitulação do
PT, sua completa adaptação ao modelo tradicional de governar. Exatamente o
oposto do que os petistas e eleitores do PT esperavam quando viram, em 2003, “a
esperança vencer o medo”.
Estamos agora em um momento de
travessia. Os próximos anos serão muito importantes na construção do desfecho
deste processo.É preciso construir urgentemente uma alternativa de esquerda
coerente para o Brasil. O PSOL já tem um acúmulo de 10 anos nesta construção.
Somos muito orgulhosos das decisões que tomamos lá atrás, em 2003, quando nos
rebelamos e fomos expulsos do PT por não aceitar assistir passivamente este
processo de auto destruição do PT, que sabíamos, seria fatal para toda a
esquerda se uma alternativa não começasse a ser construída.
Mesmo após 10 anos sabemos que
estamos no começo. Sabemos também, entretanto, que o processo político não é
linear, saltos e recuos estão sempre à nossa espreita. O Podemos na Espanha
surgiu há dois anos e já tem a uma força enorme. Tudo depende da luta de
classes e da movimentação das forças políticas e sociais. Não importa se
teremos, em 2018, força suficiente para governar. O mundo não acaba em 2018 e
nem a vida política se resume às eleições. Vejamos, por exemplo, o que ocorre
no Paraná. Depois de uma repressão brutal promovida pelo governo do PSDB, os
paranaenses realizaram o melhor 1º de maio do Brasil – onde estive com muita
satisfação – e seguiram a luta, conseguindo derrubar o Secretário da Educação,
depois o da Segurança (um reacionário da pior espécie) e o Comandante da PM.
Com certeza vão seguir, de cabeça erguida, defendendo a educação e os direitos
dos trabalhadores. É a luta vencendo o medo e abrindo caminhos.
Este é um grande exemplo a
seguir. É preciso unir forças para resistir ao ajuste e neste processo
construir uma alternativa que rompa com esta alternância fictícia entre
partidos que nos momentos decisivos aplicam, ambos, as piores políticas
anti-povo. Uma alternativa que ofereça às maiorias oprimidas a possibilidade de
conquistar um governo seu. De verdade.
Fonte: lucianagenro.com.br