Quinta, 28 de maio de 2015
Por Leandro Farias
Na mais nova
investida, emenda constitucional obriga a União a repassar parte do orçamento
da saúde para emendas dos parlamentares
O Sistema Único de Saúde (SUS) vem passando por seu pior
momento. A atual conjuntura não lhe tem sido favorável, uma vez que a
conformação do Congresso Nacional se demonstra favorável à iniciativa privada.
Grande parte dos parlamentares foram financiados durante as eleições por
empresas privadas de saúde, e liderados pelo então Presidente da Câmara dos Deputados,
Eduardo Cunha, declararam guerra ao SUS como forma de pagamento do investimento
feito por parte das empresas em suas candidaturas.
A aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC)
358/13, pela Câmara dos Deputados, que institui o chamado Orçamento Impositivo,
muda o financiamento da saúde, por parte da União, diminuindo o percentual
mínimo da receita corrente líquida de aproximadamente 14,6% para 13,2%, e com
isso o orçamento da saúde perde entre R$ 7 bilhões e R$ 10 bilhões, esse ano. A
PEC também prevê o pagamento de emendas, obrigando a União a repassar cerca de
1,2% do orçamento destinado a saúde para às emendas parlamentares individuais
de cada deputado. Tais recursos que serão retirados do SUS deverão ser
aplicados em saúde, porém não haverá garantia desse cumprimento, uma vez que o
Ministério da Saúde não fará controle.
A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), uma
autarquia federal que em tese deveria regular e fiscalizar a atividade dos
planos de saúde, desde a sua criação durante o governo FHC no ano 2000, ao
analisarmos a composição de sua diretoria é notável quais os interesses que são
defendidos. A ANS assim como outras agências reguladoras está sujeita ao
fenômeno da captura, funcionando como verdadeiros latifúndios, uma vez que após
as eleições são loteadas e entregues aos grandes empresários financiadores das
campanhas eleitorais, para que indiquem os ocupantes aos cargos de diretores
das agências.
Um belo exemplo é a empresa Qualicorp. A ANS criou as Resoluções Normativas Nº 195 e 196 que tratam da
questão dos planos coletivos por adesão e deixa claro que a venda desses planos
deve ser intermediada pelas ditas “administradoras de benefícios”. Isso
culminou no crescimento vertiginoso da Qualicorp. Segundo informações a empresa
obteve lucro de R$ 44,7 milhões só no primeiro trimestre de 2015, apresentando
um avanço de 69% em relação a 2014. Segundo relatório da empresa, 94% do seu
lucro se dá pelos planos coletivos por adesão. Lembrando que o atual presidente
da empresa, Maurício Ceschin, anteriormente havia sido presidente da ANS.
Segundo dados da própria agência, os planosde saúde registraram em 2013 o lucro de 111 bilhões de reais. Nas eleições
de 2014, as empresas Amil, Bradesco Saúde, Qualicorp e grupo Unimed saúde
doaram juntas, em torno de 52 milhões, contribuindo para a candidatura de 131
parlamentares, um deles o Cunha. Segundo informações, o Presidente da Câmara
contou com a contribuição de membros da ANS para a formulação da Medida
Provisória (MP) 627 que anistiava a dívida dos planos de saúde ao SUS em 2
bilhões de reais, e atualmente faz pressão para a indicação de José Carlos de
Souza Abrahão para o cargo de Diretor-Presidente da agência.
Abrahão presidiu a Confederação Nacional de Saúde,
Hospitais, Estabelecimentos e Serviços (CNS), entidade sindical que representa
estabelecimentos de serviços de saúde no País, entre os quais as operadoras de
planos de saúde, e já se manifestou publicamente contra o ressarcimento ao SUS
por parte das operadoras, em artigo publicado no jornal Folha de São Paulo, em
2010. Em maio deste ano (2015) o atual ministro da saúde, Arthur Chioro,
anunciou que a ANS deve cobrar cerca de R$ 1,4 bilhão em ressarcimentos de planos
de saúde.
O setor que vem sofrendo duros golpes é o da saúde, mais
precisamente o SUS. Eduardo Cunha foi relator da Medida Provisória (MP) 627 que
anistiava a dívida dos planos de saúde ao SUS em 2 bilhões de reais; votou a
favor da MP 656 que permitiu a entrada de capital estrangeiro na assistência a
saúde; é autor da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 451 que insere planos
de saúde como direitos dos trabalhadores; vetou a instalação da Comissão
Parlamentar de Inquérito (CPI) que investigaria os planos de saúde. Cunha ao
favorecer os empresários da saúde, declarou guerra ao SUS.
Uma maneira de barrar essa questão seria o fim do financiamento empresarial de campanha. A Ordem dos Advogados do
Brasil (OAB) entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) Nº
4.650, que proíbe que empresas financiem partidos políticos e campanhas
eleitorais, porém o ministro Gilmar Mendes, há um ano, pediu vista do processo.
O curioso é que a maioria dos ministros do STF (seis votos a favor e um
contrário) já tinha decidido que as empresas não podem doar, pois tal atitude
fere cláusulas pétreas da Constituição. Enquanto isso, em paralelo, Eduardo
Cunha colocará em votação a PEC 352 que trata da reforma política e
regulamentará o financiamento empresarial de campanha. A pergunta que fica:
Estariam esses dois senhores agindo em conluio?