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(Millôr Fernandes)

sexta-feira, 20 de novembro de 2015

"A Marcha das Mulheres Negras nos emociona por compartilharmos tanta resistência com milhares de mulheres negras que sofrem diariamente pelo racismo, machismo e precarização do trabalho”

Sexta, 20 de novembro de 2015
Na semana da Consciência Negra, mulheres protagonizam a luta contra o racismo e a violência

"A Marcha das Mulheres Negras nos emociona por compartilharmos tanta resistência com milhares de mulheres negras que sofrem diariamente pelo racismo, machismo e precarização do trabalho”.
A Marcha Nacional de Mulheres Negras, realizada pela primeira vez esse ano, em homenagem às nossas ancestrais e em defesa da luta por cidadania plena de mulheres negras brasileiras, traz simbolicamente a nossa resistência diante das inúmeras violações de direitos que sofremos há tantos séculos.
Somos cerca de 49 milhões espalhadas por todo o Brasil, recebendo os menores salários, ocupando os trabalhos mais precarizados como o doméstico, catadoras de materiais recicláveis, em fábricas de carvão, minério, prostituição, dentre outros que não garantam nossa emancipação enquanto trabalhadoras. Pela ausência de inserção em políticas educacionais que concilie suas atividades laborais. Ineficiência da politica de saúde que não abarca a condição peculiar da saúde das mulheres negras.
O racismo e o machismo infelizmente estão presentes nas vidas de todas as mulheres. Entretanto, o Mapa da Violência de 2015 da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso) aponta que 66,7% de mulheres negras são assassinadas a mais do que brancas. O feminicídio das negras aumentou em torno de 54% enquanto o das brancas diminuiu 9,8%. Dados como estes corroboram com outros dados alarmantes como o alto índice de mortalidade da juventude negra no país, cujo risco de morrer assassinado é 6,5% vezes maior que de jovem branco, compreendendo cerca de 77% dos jovens assassinados no país.
A Marcha tem a importância de mostrarmos ao Brasil que 57% dele é formado por negras e negros. É a comunidade onde mais tem a nossa raça/etnia depois da África. Nossas roupas, nossa música, nosso cabelo e nossa cor é nossa identidade que é tanto criticada e ao mesmo tempo apropriada por outras culturas.
Essas bandeiras também estiveram presentes na Marcha, nas mãos das mulheres que também denunciaram a tristeza e revolta de ter de enterrar seus filhos/as, netos/as, sobrinhos/as e irmãos/ãs todos os dias se fizeram presente em Brasília trazendo seu sangue e suor de mulheres que ousaram acima de tudo romper a invisibilidade que lhe são impostas e ousaram em se firmar, pela primeira vez, como protagonista de um processo histórico de luta para população negra.
Importante ressaltar que a Marcha ocorre há exatos 20 anos da Marcha Zumbi, quando pela primeira vez o Movimento Negra vinha à Brasília denunciar o mito da democracia racial e que diferente do que se propagava o Brasil não era um país que dava oportunidade iguais entre brancos e negros e o racismo era a principal causa da exclusão sofrida pela população negra e que portanto seriam necessárias medidas específicas e políticas reparatórias por parte do Estado Brasileiro para que pudesse efetivamente melhorar as condições de vida da população negra no Brasil.
Por isso, era impossível não se emocionar na Marcha. Como poucas vezes para nós mulheres negras, foi possível olhar ao nosso redor e se reconhecer em cada rosto preto que ao seu lado marchava. A cada dorso e turbante que pela estética nos remetia às raízes culturais de nossa mãe África ou cada Black Power, símbolo do empoderamento feminino, que por onde passava... Empunhava respeito... Ao Rap Feminino que entoava o hino da Marcha ou de cada mulher do Axé que abençoava cada um e cada uma que passava e, denunciava a Intolerância Religiosa que tem vitimizado o povo de santo de norte ao sul do país (No Distrito Federal, já houveram mais de 7 ataques à Casas de Religiões de Matrizes Africanas e por isso, ser guiada por Ialorixás no carro de som que gritava ao quatro ventos "Sou mulher, negra, lésbica do Axé e estou em Marcha!").
A visibilidade de ontem é só o começo da nossa força. Somos muitas, sozinhas ou juntas, nossa resistência enfrentará todas as formas de violação dos nossos direitos. Calaremos todas as falas racistas. Lutaremos por equidade em todos os espaços. Não nos esconderão mais! Não era um dia ou uma Marcha qualquer: estávamos fazendo história e sabíamos disso!
Clementina Bagno, Assistente Social e Conselheira Tutelar de Brasília (mandato 2016-2019), 27 anos. Vice-Presidenta do PSOL-DF.

Aline Costa, Pedagoga e Especialista em Adolescência e Juventude, 29 anos. Secretária de Combate as Opressões do PSOL-DF e membro da Coordenação Nacional da Insurgência/PSOL.