Do site Política Econômica do Petróleo
Petróleo
e poder econômico do Estado Islâmico
A
relação obscura entre terrorismo e o sistema financeiro internacional
Wladmir Coelho
O chamado Estado
Islâmico (EI) controla um território calculado em 210 mil quilômetros quadrados
envolvendo parte da Síria e do Iraque. O domínio desta vasta região
possibilitou o acesso e exploração econômica de campos petrolíferos, mineração,
agricultura, estações de rádio e televisão.
Os militantes do EI
não convertem-se em operários, agricultores, funcionários públicos no momento
da ocupação destas áreas preferindo estabelecer um sistema de tributação e no
caso do petróleo aplicam a regra máxima do liberalismo garantindo à iniciativa
privada a sua produção e comercialização.
As informações
referentes ao volume de recursos a disposição do EI apresentam variações e os
cálculos mais pessimistas mostravam, em dezembro de 2014, a existência de dois
trilhões de dólares em ativos e um rendimento diário de três milhões de dólares
somente com o contrabando de petróleo.
Naturalmente a
movimentação destes valores financeiros necessita do apoio do sistema bancário
internacional possibilitando, inclusive, o saque em caixas eletrônicos dos salários
para os terroristas do grupo espalhados por diferentes pontos do planeta ou
compra de armamentos e veículos, de luxo ou combate, da Toyota e outras marcas
incluindo estadunidenses.
Como fonte de
recursos financeiros o EI também atua em: tráfico de pessoas, venda de
antiguidades, sequestro. Também recebem doações dos príncipes árabes e alguns
pesquisadores ainda detectam a presença destes terroristas no mercado das
drogas.
O poder econômico do
EI fundamenta-se, principalmente, no controle de áreas produtoras de petróleo e
nestas encontramos, inclusive, a existência e funcionamento de refinarias.
Apesar dos anunciados
bombardeios às refinarias o EI revela a sua capacidade de sobrevivência ao
importar as chamadas refinarias modulares ou mini refinarias que construídas em
blocos e ligadas por tubos possuem a condição de transferência ou de rápido
reparo das partes danificadas.
Para meditação: As
fábricas destes modelos de refinarias encontram-se, em sua maior parte, nos
Estados Unidos e na China. O pacote de venda inclui desde o estudo do tipo de
petróleo a ser refinado a eventual manutenção.
Apesar de denominadas
também de mini refinarias trata-se de uma estrutura de tamanho considerável
percorrendo um longo caminho da fábrica até o seu comprador e não devemos
esquecer que o negócio com os fabricantes dificilmente foi fechado em dinheiro
vivo.
O
Estado Islâmico e o petróleo roubado da Síria
Em fevereiro de 2015
o insuspeito The Washington Institute for Near East Policy informava que “o contrabando
de petróleo bruto e derivados é fundamental a manutenção do Estado Islâmico”.
A este respeito
torna-se necessário entender a importância do petróleo para economia da Síria.
Sobre o tema o Congressional Research Service dos Estados Unidos em abril de
2015 comunicava aos senadores e deputados dos Estados Unidos que o petróleo até
2011, antes da guerra civil, representava para a Síria 25% de suas receitas e
45% de suas exportações.
Além do conflito
armado, completava o informe oficial, as sansões dos Estados Unidos contra o
governo Bashar al-Assad, contribuíram para a queda e impedimentos legais para a
comercialização do petróleo sírio.
Assim não fica
difícil concluir que o espaço comercial torna-se, inclusive em função do
bloqueio comercial da Síria, aberto aos contrabandistas prontos para atender a
qualquer interessado.
Retornando ao informe
do Congresso dos Estados Unidos o controle das áreas produtoras de petróleo na
Síria encontram-se controladas pelo EI enquanto as instalações de exportação
continuam em poder do governo.
Ao que sabemos este
fato não impediu o contrabando de petróleo por parte do EI considerando o
conteúdo do citado informe do Congresso dos Estados Unidos: “O petróleo
[controlado pelo EI] é enviado por caminhões à fronteira com a Turquia e
vendido a corretores de petróleo”.
Neste sentido o
informe do The Washington Institute for Near East Policy completa: “O
contrabando de petróleo bruto e derivados é fundamental para a manutenção do
Estado Islâmico (...) gerando entre dois e três milhões de dólares ao dia”.
As
sanções econômicas na origem das redes de contrabando
A
culpa é do Saddam
Os Estados Unidos apresentam
de forma rotineira a punição comercial aos governantes que não atendem de forma
satisfatória as suas determinações. A vitimas deste ato autoritário e
imperialista constituem, via de regra, de países produtores de petróleo com
limitado poder de defesa militar.
Não raramente
segue-se ao bloqueio a formação de um “exército rebelde” que da noite para o
dia apresenta-se bem armado dominando vastas áreas com potencial ou produtoras
de petróleo.
Os casos mais
recentes encontraremos na Líbia e Síria. No passado, não muito distante, O
Iraque passou por um roteiro semelhante com consequências cruéis para a
população civil.
Ao privar um país da
comercialização de sua principal fonte de riqueza a consequência imediata
foi a fome. Este fato escandalizou o mundo obrigando a criação pela ONU, como
forma de “humanizar” o bloqueio dos Estados Unidos, o programa “petróleo por
alimentos” permitindo o escambo do mineral por produtos alimentícios.
O resultado paralelo
do bloqueio ao Iraque foi a criação de uma rede de contrabando base do atual
modelo existente na fronteira com a Turquia conforme revela o anteriormente
citado informe do The Washington Institute for Near East Policy: “A atual rede
de contrabando de petróleo utilizada pelo Estado Islâmico é antiga e foi
iniciada por Saddam Houssein em função do embargo comercial”.
O
EI um inimigo dos Estados Unidos?
Desde julho de 2014
os Estados Unidos, detentor de um poderoso complexo de guerra, combatem
diretamente o EI apresentando resultados pífios no campo militar e econômico.
A este respeito David
S. Cohen, ex subsecretário para o terrorismo e inteligência financeira dos
Estados Unidos, revelava em outubro de 2014: “Do mesmo modo como acontece com o
resto da campanha [militar] contra o Estado Islâmico, nossos esforços para
combater o seu financiamento vai levar tempo. Nós não temos nenhuma bala de
prata, nenhuma arma secreta para esvaziar os cofres do Estado Islâmico da noite
para o dia.”
Vejamos: O Estado
mais poderoso do mundo do ponto de vista militar e inteligência que consegue
espionar os dirigentes de países como a Alemanha, segundo um membro de seu
governo, não possui informações suficientes para barrar no campo militar e
econômico um grupo de terroristas constituído, em sua base, por adolescentes?
O EI não brotou de um
poço de petróleo no Iraque em 2014 o grupo terrorista articula-se com outras
forças desde 2004 existindo grande dificuldade para uma pessoa normal acreditar
no desconhecimento dos Estados Unidos dos objetivos e atividades de seus membros.
A este respeito o
professor Gunter Meyer – diretor do Centro de Pesquisa para o Mundo Árabe da
Universidade de Mainz – apresenta uma interessante afirmativa publicada em
junho de 2014 no site do Deutsche Welle: “A fonte inicial do financiamento do
Estado Islâmico tem origem nos países do Golfo [Pérsico] principalmente a
Arábia Saudita, Qatar, Kuwait e os Emirados Árabes Unidos”.
E continua o
professor Meyer ao explicar o apoio destes aliados de primeira hora dos Estados
Unidos ao EI: “A motivação deste apoio é a luta contra o regime do presidente
Bashar al Assad na Síria”.
Quanto a convivência
ou conivência entre os Estados Unidos e EI o professor Meyer apresenta uma
constatação demolidora: “Durante a conquista de Mosul [Iraque] os membros do Estado
Islâmico ostentavam grande quantidade de armas e veículos estadunidenses”.
O controle de áreas
produtoras de petróleo no Iraque desde 2013 possibilitou ao EI a produção de
pelo menos 10 mil barris ao dia.
Armas e acesso facilitado
ao sistema financeiro internacional constituem poderosos insumos ao
fortalecimento do Estado Islâmico. A origem apresenta-se de forma cristalina.
Sistema
financeiro internacional e terrorismo
Enquanto o governo
dos Estados Unidos revela a sua “surpresa” e “perplexidade” diante do poderio
econômico e militar do EI um grupo de antigos combatentes feridos no Iraque
após um ataque terrorista resolve processar os bancos Credit Suisse AG, HSBC,
Standard Chatered, Royal Bank of Scotaland e Barclays PLC.
Estes veteranos de
guerra e familiares dos militares mortos exigem, desde novembro de 2014, uma
indenização de 150 milhões de dólares dos bancos, que segundo eles,
possibilitaram a movimentação dos recursos financeiros do grupo terrorista
responsável pelo atentado.
Observe: Uma
associação de ex-combatentes conseguiu rastrear o movimento financeiro de um
grupo terrorista envolvendo, pelo menos, cinco bancos internacionais. Enquanto
isso o governo do país que controla um gigantesco sistema de espionagem afirma
não possuir uma “bala de prata” para colocar fim no poder econômico do IE.
Talvez a arma secreta
sonhada pelo antigo subsecretário David S. Cohen não seja tão secreta assim.
O The Financial
Action Task Force (FATF), entidade intergovernamental responsável pelo combate
a lavagem internacional de capitais financeiros, apresentou em seu relatório de
fevereiro de 2015 um roteiro básico da movimentação financeira do EI.
Apesar de resaltar
que “uma parcela significativa dos dados relacionados a este assunto é de
natureza sensível tornando-se por isso restritos ao conhecimento público” o
relatório da FATF confirma o petróleo como principal fonte de recursos do IE e
revela a existência de um sistema bancário próprio deste grupo associado aos
órgãos financeiros internacionais e foram detectados depósitos em numerário
excessivos em contas nos Estados Unidos transferidos em seguida para áreas
próximas daquelas controladas pelo EI.
Como forma de
facilitar esta integração financeira somente no território iraquiano controlado
pelo EI, principalmente em Mosul, existem 90 sucursais de bancos internacionais
que continuam operando inclusive com serviço de caixas eletrônicos cuja
estrutura parece imune aos bombardeios.
O EI quando o assunto
é respeito a propriedade privada dos bancos atua de forma curiosa segundo o
relatório do FAFT “o dinheiro existente em bancos estatais passa a ser
propriedade do Estado Islâmico” enquanto aqueles encontrados nos bancos
privados são religiosamente respeitados aplicando-se ao correntista “uma
tributação no momento do saque”.
Com relação ao banco
estatal do Iraque, continua o relatório do FAFT: “Estima-se que o Estado
Islâmico passou a controlar meio bilhão de dólares de bancos estatais no
Iraque”. O documento não apresenta com clareza como este recurso seria
utilizado em transações internacionais considerando a necessidade de sua
conversão em moeda estadunidense cuja abundancia na região do Golfo Pérsico é
bastante conhecida.
A resposta para a
forma de conversão dos dinares em dólares talvez encontremos a partir da
liberação da “parte sensível” do relatório.
O escritório de
advocacia Duhaime especializado em análise para grandes empresas, governos e
corporações a respeito de atividades financeiras dos grupos terroristas é
responsável pela elaboração de um documento muito acessado por interessados em
compreender a movimentação dos recursos financeiros do EI.
Neste documento intitulado White Paper
on Islamic State, lançado em maio de 2015, estranha-se que “Até a data do
lançamento deste documento os setores públicos ou privados pouco realizaram
para detectar ou prevenir o financiamento do Estado Islâmico” e completa com
relação a movimentação dos recursos decorrentes da principal fonte de renda do
EI: “Não é possível um comércio de petróleo sem o envolvimento e apoio de
instituições financeiras de forma voluntária ou não”.
Vejam que a autora é delicada e oferece
o beneficio da dúvida ao sistema financeiro internacional que é conhecido e
reconhecido, desde a renascença, pela inocência e bondade de seus dirigentes.
Continuando: O documento ora em análise
informa que o Banco Mosul continua operando, com gestores do EI, realizando
normalmente suas operações de pagamento e transferências e portanto, ligado ao
sistema financeiro mundial.
O mesmo, o funcionamento dos bancos,
ocorre na região da Síria controlada pelo Estado Islâmico observando-se,
reafirma-se, a manutenção dos caixas eletrônicos.
Turquia a sede econômica do ISIS?
Neste ponto resgatamos o Sr. David S.
Cohen, ex subsecretário para o terrorismo e inteligência financeira dos Estados
Unidos que revela em documento citado anteriormente neste texto: “Quem em
última análise está comprando esse petróleo [comercializado pelo Estado
Islâmico]? De acordo com nossas informações, desde o mês passado [setembro de
2014] o Estado Islâmico vende a baixo preço a uma variedade de intermediários
incluindo alguns da Turquia (...) parece também que parte do petróleo foi
vendido a curdos no Iraque e depois revendidos a Turquia.”.
As informações até aqui apresentadas em
sua maioria originadas de instituições oficiais dos Estados Unidos revelam que
a Turquia – um importante aliado dos Estados Unidos – apresenta um papel
fundamental na comercialização da principal fonte financeira do Estado
Islâmico.
Neste ponto o anteriormente citado
White Paper on Islamic State aprofunda a questão revelando que: “Segundo
informações da imprensa turca o Estado Islâmico possui um consulado em Ancara –
de forma ostensiva – que emite vistos oficiais e administra grandes residências
e automóveis blindados para seus líderes.”
Prossegue o documento afirmando que o
uso do sistema bancário, neste caso, é facilitado através da criação de empresas
na Turquia e utilização do sistema bancário internacional a partir deste país.
E oferecendo o beneficio da dúvida
completa: “Empresas de serviços financeiros dos Estados Unidos também fornecem
serviços aos membros do Estado Islâmico no Iraque, na Síria e também na Turquia
e no Líbano sem dúvida de forma inconsciente”.
No território de um outro aliado dos
Estados Unidos o beneficio da dúvida perde força e informa a autora em análise:
“No Katar os terroristas do Estado Islâmico tornam-se clientes preferenciais ou
VIPs e através dos bancos locais aplicam em qualquer parte do mundo incluindo
em fundos internacionais”
O sistema financeiro internacional
condena a humanidade às trevas
A associação do poder econômico gerado
a partir da exploração petrolífera aos totalmente desregulamentados bancos
internacionais revela a crueldade de um sistema cujo único objetivo encontra-se
no lucro.
Esta tenebrosa associação não ocorre
apenas entre o EI e bancos revela-se de forma cristalina inclusive entre os
detentores do oligopólio do petróleo cujo papel no modelo de sustentação
econômica do EI necessita de uma análise cuidadosa.
Afinal quem garante o fornecimento de
equipamentos de exploração, treinamento de mão de obra para o funcionamento dos
campos petrolíferos controlados pelo EI?
Devemos ainda considerar que a queda na
produção de petróleo no Iraque e a venda, através da Turquia, de petróleo
contrabandeado a preços inferiores aos praticados no mercado, contribuem
efetivamente para a manutenção da política deliberada que prejudica as
economias de países como Venezuela, Rússia e Irã.
Esta prática também favorece a reserva
de grandes quantidades de petróleo em áreas de fácil exploração enquanto os
Estados Unidos utilizam-se do petróleo derivado do xisto reservando para o
futuro o petróleo fruto destas regiões em conflito.
O capital mata para garantir a sua
reprodução enquanto isso os detentores do monopólio da informação enganam os
trabalhadores apresentando a farsa do noticiário no qual homens bons combatem
homens maus. Na realidade associam-se de forma subterrânea aos assassinos.