Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

sexta-feira, 22 de maio de 2015

Brasil — Pátria Educadora

Sexta, 22 de maio de 2015
Da Tribuna da Imprensa
IGOR MENDES
“E agora você quer um retrato do país- mas queimaram o filme, queimaram o filme...”. (Legião Urbana- “Mais do mesmo”).

A imprensa oficiosa do país e o governo da Sra. Dilma são daqueles que acham que mudar o nome de uma coisa equivale a mudar a essência da coisa mesma. Como se o eufemismo “ajuste”, substituindo depredação de direitos, arrocho e recessão alterasse de algum modo a piora das condições de vida da população brasileira. Dilma, reeleita, rasgou tudo o que disse quando era candidata, inclusive a declaração de que os direitos trabalhistas não seriam tocados “nem que a vaga tussa”. Pois a pobre vaca, a essa altura tuberculosa e moribunda, foi pro brejo- estão aí os aumentos de impostos e o desmonte dos direitos laborais consolidados como o seguro desemprego, auxílio- doença e pensão de morte, a fim de defender os interesses predatórios do capital financeiro. A famigerada lei de terceirização, que não apenas legaliza as precaríssimas condições de trabalho dos cerca de 12 milhões de proletários que se encontram nessa situação como as estende potencialmente aos outros 34 milhões ainda resguardados pela CLT: é a cereja do bolo dessa sucessão impressionante de ataques à classe operária. Enquanto isso os serviços públicos básicos, como saúde e educação, sofrem violentos contingenciamentos e pioram dia após dia. Só a cara-de-pau pode estampar no slogan desse governo: “Pátria educadora”.
FARINHA DO MESMO SACO

Foi extremamente significativo, além de revoltante, o que ocorreu no Paraná no último dia 29 de abril. Não porque seja novidade, policiais espancarem professores, ou que seja isso “privilégio” do PSDB- na greve da categoria na Bahia, governada pelo petista Jaques Vagner, e sobretudo no Rio, do “aliado” Sério Cabral, viu-se truculência igual ou maior. Mas o fato é que tenta o PSDB, nos últimos meses, de modo oportunista, tagarelar a respeito de “defesa dos trabalhadores” e até mesmo, creiam, “direito de manifestação”. Esse PSDB que dilapidou o patrimônio nacional, vendendo-o a preço de banana quando das escandalosas privatizações, financiadas ademais com o mesmo dinheiro público que essa gente diz agora defender! Esse PSDB que, pela boca do então gerente de turno e seu papa FHC, chamou os aposentados de vagabundos! Nada pode ser mais danoso para o nosso povo, realmente, do que embarcar nessa falsa polarização, quando não há qualquer diferença entre os governos tucano-petistas.
CRESCE O CLAMOR PELA GREVE GERAL
Nesse contexto cresce consciência, tanto espontaneamente como entre os setores organizados, a respeito da necessidade de deflagrar as drásticas medidas antioperárias aplicadas pelo governo. É evidente que desenrola-se uma batalha de morte, que terá repercussões para a atual e futuras gerações de trabalhadores, e ela não poderá ser vencida com belos discursos e meias medidas. Falar contra o “ajuste” e não tomar nenhuma medida prática contra ele, ou depositar qualquer esperança nesse congresso de corruptos e escravocratas que temos é hipocrisia, um embuste que não levará a lugar algum. É urgente que o proletariado derrube as velhas “direções” pelegas e atreladas ao jogo sujo da política oficial, retome um sindicalismo apoiado no trabalho de base e independência de classe, e desfralde a bandeira de não ceder nenhum dos seus direitos adquiridos com muito sacrifício, inclusive derramamento de sangue- quanto mais decidida for essa luta, menos se perderá. Outros países do mundo, notadamente na Europa, viram seus trabalhadores barrarem com greves gerais algumas medidas gritantes das lá chamadas “políticas de austeridade”. Das duas, uma: ou sucumbirá a classe, retrocedendo quando às suas garantias, a uma situação anterior à década de 40 do século passado; ou sucumbirá esse velho movimento sindical imprestável para a luta de classes, mafioso e corporativizado, e nesse caso poderemos dizer que há mesmo males que vêm para o bem.
UMA DECISÃO CRUCIAL
Aguardamos com grande expectativa a decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) a respeito da concessão ou não do habeas corpus impetrado a meu favor e de duas companheiras que se encontram atualmente na clandestinidade. O Ministério Público Federal (MPF), através da Subprocuradora-Geral da República Áurea Lustosa Pierre, deu parecer favorável à concessão do HC, sublinhando: “É de se assinalar que proibir a participação em “manifestação” ou mesmo em “protesto” não se configura adequado no estado democrático de direito (...). Melhor será considerar a liberdade de manifestação de pensamento como direito constitucional, não podendo ser objeto de restrição pelo legislador- nem pelo poder judiciário”.

Embora flagrantemente inconstitucional, esse dispositivo, de vedar a ativistas processados a frequência em manifestações públicas, tem sido utilizado e há muito tempo pelos tribunais estaduais- embora o TJRJ tenha sido o primeiro a valer-se disso para manter pessoas encarceradas. Caso o STJ, uma corte superior, consagre os argumentos em nossa defesa e o parecer categórico do MPF estará formando jurisprudência que, ao menos em tese, evitará que no futuro outras pessoas sejam violentadas nos seus direitos fundamentais, dentre eles a própria liberdade, como nós fomos. Um motivo a mais, e muito relevante para que cada minuto passado na prisão não tenha sido em vão.
Rio de Janeiro, 12 de maio de 2015- 160 dias de detenção.
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