Sexta, 31 de outubro de 2014
Do TJDF
O juiz da 7ª Vara Cível de Brasília condenou a DNA
Propaganda e seus sócios Marcos Valério, Cristiano Paz e Ramon
Hollerbach, por litigância de má-fé, a pagarem de forma solidária
montante de cerca de R$ 4 milhões ao Banco do Brasil S/A - BB e à
Companhia Brasileira de Meios de Pagamento – Visanet. A sentença foi
dada na ação de cobrança ajuizada pela DNA e seus sócios contra o banco
público e a Visanet.
A autora afirmou que entabulou com o BB contrato de prestação de
serviços de publicidade, em 23/09/2003, englobando todo o grupo
econômico, inclusive a Visanet. Relatou que, a despeito da regular
prestação dos serviços contratados, recebeu uma correspondência do
banco, informando sobre a rescisão unilateral do contrato e a suspensão
dos pagamentos ainda em curso. Na missiva, o BB alegava ter efetuado
vários pagamentos à empresa sem ter tido a devida contraprestação dos
serviços publicitários. Diante desses fatos, a autora pediu na Justiça a
condenação do banco ao pagamento da dívida, que segundo afirmou,
equivaleria ao montante de R$ 12.947.436,09.
Em contestação, o BB negou estar inadimplente com a empresa. Relatou
que em 2001 foi criado o Fundo Emissor Visanet, com o objetivo de
promover no Brasil a marca e o uso dos cartões Visa, em concorrência à
bandeira Mastercard. Que até 2002, o controle dos recursos do fundo era
exercido pela própria Visanet. A partir de 2003, esses recursos, que
eram provenientes de 1% do faturamento da Visanet, passaram a ser
repassados diretamente para a DNA, contratada para promover ações de
incentivo e publicidade da marca. Sustenta que em 2004, a DNA foi
autorizada a realizar 57 ações de incentivo para a Visanet, que
totalizavam R$42.216.13,04. Ocorre que os repasses feitos à DNA somaram
no período o valor de R$44.102.623,72, e por esse motivo havia um saldo
credor em favor da Visanet no importe de R$2.064.522,61 para o ano de
2004, o que teria sido devidamente notificado à empresa.
Além disso, o banco informou que o TCU identificou uma série de
irregularidades praticadas pela DNA no âmbito da execução do contrato em
questão, o que teria produzido uma apropriação indevida por parte da
empresa de um valor de R$18.506.831,60 e mais R$19.156.712,09, que não
autorizou a auditoria determinada na época. Ao final, chamou a atenção
para o fato do envolvimento da DNA na ação penal nº 470, precisamente
sob o fundamento de que o repasse de recursos referente aos meses de
maio/2003, março/2004 e junho/2004, realizado por intermédio do contrato
de publicidade entabulado entre a DNA e o BB, no total de
R$73.851.000,00, não tinha respaldo em documentos.
A Visanet também contestou a cobrança, alegando que a DNA foi o
principal instrumento de um dos maiores escândalos de corrupção no país,
conhecido como mensalão, por meio do famoso “valerioduto”. Informou que
não havia nenhuma relação direta entre a Visanet e a DNA e que todos os
pedidos de pagamentos formulados pelo BB à Visanet, referentes a ações
de marketing foram devidamente efetuados. Sustentou ainda que a autora
não fez prova documental da prestação dos serviços de publicidade cuja
remuneração postula em juízo, assim como as ações de incentivo que
fundamentam a presente cobrança jamais poderiam ser pagas pela Visanet,
uma vez que não as contratou nem foram objeto de pedidos de pagamento
feitos pelo BB.
Durante a instrução processual, o juiz determinou a suspensão da ação
até que o STF julgasse os réus envolvidos no mensalão do PT, já que o
caso em apreço tinha relação com o resultado daquela ação penal.
Da litigância de má-fé
Ao sentenciar o processo, o juiz afirmou: “Seria suficiente para o
decreto da manifesta improcedência do pedido de cobrança formulado pela
autora o fato de que esta não produziu qualquer prova da prestação dos
serviços a que se refere à contraprestação reclamada em juízo, como
exige o artigo 333, inciso I, do CPC, norma que consagra o princípio
segundo o qual incumbe a quem alega um direito fazer a sua prova”.
Porém, segundo afirmou, além da falta de prova, “ficou demonstrado nos
autos da ação penal 470, sob a firme relatoria do eminente Ministro
Joaquim Barbosa que tais serviços não foram efetivamente prestados,
circunstância que ensejou a condenação do representante e
vice-presidente administrativo-financeiro da DNA à época a que se refere
a presente cobrança, Sr. Marcos Valério Fernandes de Souza, nas penas
dos crimes de peculato e corrupção ativa”.
E, prosseguiu, “como é sabido, em rigor, as instâncias jurisdicionais
civis e penais são independentes. Tal independência, contudo, não
ostenta caráter absoluto, mas relativo, uma vez que, nos termos do
Código Civil de 2002, a responsabilidade civil é independente da
criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou
sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas
no juízo criminal. Havendo coisa julgada sobre o fato em sua dimensão
penal, sua imutabilidade repercute na esfera cível até mesmo pela
natureza objetiva e erga omnes que a distingue da coisa julgada cível”.
Sobre a litigância de má-fé, o magistrado ressaltou: “Ocorre que, não
satisfeita com o montante milionário de recursos públicos parasitados
do BB, acumulados por seus sócios e controladores ao longo da ilícita e,
indevidamente, prorrogada vigência contratual, a autora decidiu ainda,
em verdadeira afronta à dignidade do Poder Judiciário, propor a presente
ação de cobrança, cujo ajuizamento constitui não apenas um acinte ao
conjunto da sociedade brasileira, especialmente àqueles que mantêm
relações com as instituições financeiras, como também um menoscabo
absoluto a todas as instituições públicas brasileiras competentes para a
análise das ilicitudes civis, administrativas e penais praticadas ao
longo da vigência do contrato sob exame, quer o Tribunal de Contas da
União, quer a Controladoria Geral da União, quer o Poder Judiciário.
Este aspecto se mostra ainda mais grave porque a presente ação de
cobrança foi proposta em 01/07/2008, momento em que já tramitava no STF a
ação penal nº 470, ajuizada pela Procuradoria Geral da República em
12/11/2007. Desse modo, a autora já tinha plena ciência das gravíssimas
acusações que pesavam contra os seus dirigentes e controladoras, assim
como a instrumentalização ilícita da autora para a prática de uma gama
inacreditável de delitos previstos no Código Penal e na Legislação penal
especial.
E, concluiu: “Indubitavelmente, neste cenário, a par da manifesta
improcedência do pedido de cobrança, quer por falta de provas da
prestação dos serviços a cargo da autora, quer pela prática de dezenas
de atos de falsidade documental e ideológica já reconhecidos por prova
pericial, quer pela apropriação indevida de recursos de propriedade das
requeridas, é forçoso reconhecer que a autora incorreu no exercício
abusivo do direito de ação e por conseguinte sua conduta configura
litigância de má-fé, pois violou os preceitos da honestidade e da
lealdade processual assentados no artigo 17 do Código de Processo Civil
Brasileiro”.
Por ser sentença de 1ª Instância, ainda cabe recurso.