Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

domingo, 19 de outubro de 2014

Uma tese: a convivência com a corrupção

Domingo, 19 de outubro de 2014
Do jornalista baiano Luís Augusto Gomes, editor do Blog PorEscrito
O jornalista da Folha de S. Paulo quis saber apenas se o governador Jaques Wagner [da Bahia], assim como a presidente Dilma Rousseff e o PT, via como “golpe” ou “calúnia” a confissão de crimes feita à Justiça por um acusado que foi diretor da Petrobras nos governos Lula e Dilma.

Depois de atribuir o fato à campanha eleitoral, na qual se estaria tentando criar “um palanque”, e proferir a estranha tese de que “a corrupção é um tema rejeitado pela população”, Wagner, ainda na primeira resposta, enveredou pelo que, na verdade, se atocaiava em seu raciocínio.

“Não reconheço em Aécio Neves alguém que possa dar aula de ética. O povo sabe que tem santo e diabo em todos os partidos. No meu e nos outros”. Pronto! Havia a “convivência com a seca”. O governador da Bahia inaugura agora a convivência com a corrupção.
Santo e diabo, no caso, são reles eufemismos. Wagner sabe que o que há no meio que frequenta são ladrões, é possível até que os conheça de longe, mas aceita esse quadro legalmente anômalo e, em última análise, dele se beneficia, porque, por exemplo, o caixa dois anônimo, feito à base de dinheiro público, se é de todos os partidos, é também daqueles que o apoiam.

Como Lula, que assumiu o comando do país à frente de uma avalanche popular que respondia ao discurso da ética, Wagner projetou inicialmente essa imagem, transfigurada, no entanto, ao ponto de, agora, ele entender que Aécio não é pessoa indicada para falar de ética. Ótimo. Sendo assim, ele não precisará, nesse aspecto, explicar o PT.

Wagner repetiu palavras com que passou a sintetizar o pensamento sobre muitas coisas, como “palhaçada” e “besteirol”, que nos tempos de lhaneza e serenidade não faziam parte de seu vocabulário. E disse ser falsa a fama de gestor de Aécio, que, “sem apreço pelo trabalho” e “passeando no Rio”, deixava o governo mineiro para o vice Antonio Anastasia.

A entrevista, segunda-feira passada, foi, de longe, o mais importante acontecimento político no Brasil em uma semana tão intensa, marcada por um debate presidencial sanguinolento e baixo. É lamentável que as declarações do governador não tenham tido na imprensa, por incompetência ou descompromisso, a dissecação pública que exigiam.