Da Tribuna da Imprensa
Por JULIANO MEDEIROS - Via Facebook
Como todos sabem, evito tratar temas internos do PSOL nesta página.
No entanto, a decisão do partido em desliga-lo de seus quadros já é
pública e quero agora registrar minha posição. Evitei me manifestar
antes sobre isso por duas razões.
Primeiro, porque além de membro do Diretório Nacional, também sou
coordenador político da Liderança do PSOL na Câmara dos Deputados, e
seria muito desconfortável expor minha posição publicamente nessas
circunstâncias. Segundo, porque ainda tinha esperanças de que Daciolo
pudesse voltar atrás em alguns temas, evitando assim seu desligamento do
partido.
Conheci Daciolo alguns meses atrás no Rio de Janeiro. Estive com ele
várias vezes antes de sua posse como Deputado Federal e, depois de
empossado, passamos a ter uma convivência diária. Recebi sua eleição com
grande entusiasmo, porque imaginava que ter uma liderança popular como
Daciolo na bancada federal do PSOL enriqueceria nossa intervenção no
parlamento.
Embora suas preferências religiosas me causassem certo desconforto (o
que é um problema meu, não dele), nunca me pareceram razão para
considerar Daciolo incompatível com o PSOL. O mesmo vale para o fato
dele ser um militar: um partido que quer transformar o Brasil num abrigo
para seu povo, deve ter ao seu lado militares comprometidos com a
democracia e a justiça social.
Com isso, quero afirmar que Daciolo não foi desligado do PSOL por ser
militar ou evangélico. Os militares progressistas e os evangélicos que
querem a transformação são muito bem-vindos no PSOL. Temos muitos
evangélicos e militares filiados ao PSOL, o que só enriquece nossa
pluralidade interna.
Daciolo foi desligado porque sua atuação parlamentar tornou-se
incompatível com determinadas posições do PSOL. E não me refiro aqui à
totalidade de sua atuação parlamentar. Na imensa maioria dos temas,
Daciolo votou seguindo a orientação da bancada do PSOL. O problema é que
seu mandato tem sido dedicado a temas que ferem princípios do PSOL,
como a proposta de alteração na Constituição Federal para que o texto
passe a afirmar que “todo poder emana de Deus” e a exigência de que o
PSOL se engaje na defesa dos policiais militares acusados pela morte do
pedreiro Amarildo.
Daciolo diz algo que é verdadeiro: o PSOL do Rio de Janeiro, quando o
filiou, sabia que ele era cristão e evangélico. Mas ninguém poderia
prever que seu mandato seria colocado a serviço de causas como as que
descrevi acima. Nossa concepção em defesa dos militares como
trabalhadores que tem seus direitos, e a defesa do Estado laico, não
comportam as iniciativas tomadas por Daciolo.
Para mim, que tive a oportunidade de conviver com Daciolo nos últimos
meses, a decisão de votar a favor de sua expulsão foi muito amarga.
Primeiro, porque sei que Daciolo é um bom homem, honesto, íntegro e que
seguirá trabalhando para o bem daqueles que busca representar. Embora
isso não seja o bastante para ser do PSOL, são qualidades indispensáveis
a um homem público. Segundo, porque o PSOL sem Daciolo, é um PSOL menos
popular e isso é uma perda irreparável.
O desligamento de Daciolo não pode representar, em hipótese algum,
que o PSOL se contenta em representar apenas os setores médios da
sociedade. Terceiro, porque sei que, apesar de posições equivocadas em
outros temas, Daciolo continuará se posicionando a favor dos direitos
dos trabalhadores na Câmara dos Deputados, junto com o PSOL. Por tudo
isso, considero que o desligamento de Daciolo, embora necessário para
evitar mais desgastes ao PSOL e preservar determinados princípios do
partido, é uma derrota de toda a esquerda. Não pela decisão de
desliga-lo em si – a única possível, diante das posições que ele próprio
assumiu – mas porque mostra nossas dificuldades em incorporar setores
populares que, apesar das contradições que expressam, são absolutamente
indispensáveis para a vitória de um projeto socialista, democrático e
libertador.
Perdemos Daciolo para não perder nossa coerência. Mas isso, como tudo na vida, também tem seus prós e contras.