Terça, 20 de maio de 2015
Da Tribuna da Imprensa
Por HÉLIO DUQUE
Na história brasileira, desde a independência, diferentes
modelagens constitucionais foram votadas democraticamente e outras paridas
pelos regimes ditatoriais. As diferentes Constituições, elaboradas por
constituintes ou as impostas pelo autoritarismo, tem um consenso: o Estado
burocrático e patrimonialista é intocável. O notável escritor latino-americano
Octávio Paz definiu que “patrimonialismo é a vida privada incrustada na vida
pública.” No Brasil, patrimonialismo é secular. Muito bem caracterizado pelo jurista
e historiador Raymundo Faoro em “Os Donos do Poder”. Demonstra que a herança
ibérica ao lançar as bases para a formação do Estado tutor nele “o governo tudo
sabe, administra e provê, distribuindo riqueza e qualificando os opulentos”.
Na mesma perspectiva, o historiador Sérgio Buarque de
Holanda, em “Raízes do Brasil”, comprova que o patrimonialismo brasileiro tem
profunda resistência à meritocracia e impessoalidade na administração da gestão
pública. Certamente havia lido “Economia e Sociedade” de Max Weber, adaptando o
seu pensamento à realidade brasileira. Nele, Weber afirma que o patrimonialismo
é quando o governo adona-se dos recursos do Estado, distribuindo para grupos
poderosos na economia. O interesse público e o privado torna-se aliado intocável
na dominação e usufruto da máquina do Estado. O populismo, com diferentes
roupagens ideológicas, é a sua principal fornalha alimentadora.
Os predadores da riqueza estatal tem caminho livre para
transformar a administração pública em extensão dos seus próprios negócios. O
aparelhamento da estrutura pública consolida o tráfico de influência, gerando a
corrupção incontrolada. A “Operação Lava Jato”, traduz com indiscutível clareza
o enorme poder do patrimonialismo brasileiro. Dependesse da apuração dos ilícitos,
a ação dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, tudo continuaria como
d’antes no quartel de Abrantes. Coube ao Ministério Público Federal e à Polícia Federal, órgãos de Estado, com
autonomia assegurada pela Constituição, deflagrarem a operação que denunciou a
dilapidação da Petrobrás, pela incompetência dos seus dirigentes, gerando a
corrupção que hoje envergonha os brasileiros. Aliado ao fato de um juiz sério,
ético e competente como Sérgio Moro, ser o julgador.
A privatização dos bens públicos gerando o enriquecimento
rápido de agentes estatais e de grandes grupos empresariais é comportamento
aceito pelos governos brasileiros, independente de suas filiações ideológicas.
A política patrimonialista é um sólido alicerce do nosso Leviatã tupiniquim. A
anti-modernidade nas áreas políticas, econômicas e sociais permeia a formação
do poder nacional. E a grande vítima é o brasileiro anônimo que, com o seu
trabalho empreendedor, é o principal gerador das riquezas expropriadas pelo
clientelismo patrimonialista.
Um exemplo: na última década, o Tesouro Nacional
transferiu recursos de R$ 435 bilhões para o BNDES, pagando taxas de mercado.
São emprestados a juros negativos, a TJLP, para empresas “apelidadas” de
campeões nacionais do desenvolvimento. Hoje o grupo JBS (Friboi) tem 25% de
participação do banco e outros como Eike Batista deram com “os burros n’água”.
A fila é gigantesca. Hoje a TJLP - Taxa de Juros de Longo Prazo é de 6% ao ano.
A rigor, o populismo econômico é parte indissociável dos
governos amantes do populismo político. Nos governos Lula da Silva e Dilma
Rousseff atingiu-se o nível máximo. Consolidando um padrão diferenciado,
extremamente nocivo para os brasileiros. Emergiu um patrimonialismo inovador
aliançando sindicalismo e uma parcela da elite larápia, dona de apetite
pantagruélico em cima dos recursos públicos. Traindo a própria história do PT,
que pregava um “projeto de Brasil” na sua origem e no governo o renegou,
buscando consolidar um “projeto de poder” a qualquer custo.
O contubérnio de interesses públicos e privados é
obstáculo ao verdadeiro desenvolvimento econômico. A crise econômica e social
que vem atingindo os brasileiros, após a euforia do “nunca antes na história
desse país”, é o resultado gerado pelo populismo clientelista-patrimonialista
dos últimos anos.