Quinta, 20 de novembro de 2014
Andreia Verdélio - Repórter da Agência Brasil
Mais da metade (55,6%) dos adultos quilombolas estão
em situação
de insegurança alimentar no Brasil. Os dados estão no estudo Quilombos do Brasil: Segurança Alimentar e Nutricional emTerritórios Titulados, lançado hoje (20) pelo Ministério do Desenvolvimento
Social e Combate à Fome (MDS) e pela Secretaria de Políticas de Promoção da
Igualdade Racial (Seppir). A publicação apresenta a pesquisa sobre a situação
alimentar e nutricional em comunidades quilombolas e o acesso delas a serviços
e programas governamentais, além do perfil socioeconômico das famílias e
comunidades.
Entre crianças e adolescentes, 41,1% da população
estudada estão na mesma situação de insegurança alimentar. Quando analisada por
regiões, a maior taxa é encontrada no Baixo Amazonas (79,1%), e a menor em
comunidades do Semiárido (15,9%). O estudo também engloba o nordeste paraense,
com 43% das crianças vulneráveis, o norte maranhense (45,7%), o norte Semiárido
(31,7%) e o Centro-Sul (18%).
“O quadro vivenciado pelo Baixo Amazonas é
gravíssimo quando se constata que a cada cinco residências, quatro têm crianças
com carência alimentar – fome. As regiões nordeste paraense, norte maranhense e
norte Semiárido têm frequências elevadas, e no Semiárido e Centro-Sul os
valores são expressivamente mais baixos, porém observa-se a existência dessa
situação”, diz o estudo.
A coleta em campo foi realizada em 2011, em 55
municípios de 14 estados. Foram visitados 97 territórios quilombolas, nos quais
vivem 40.555 pessoas, em 9.191 domicílios distribuídos em 169 comunidades. O
levantamento leva em conta as comunidades que receberam o título de posse coletiva
da terra, entre 1995 e 2009, e também apresenta dados sobre o estado
nutricional das crianças menores de 5 anos.
O
estado nutricional de uma pessoa é o reflexo da ingestão, absorção e utilização
dos nutrientes dos alimentos, e a população quilombola estudada apresentou
maior déficit de estatura em crianças. “O déficit de estatura reflete a
desnutrição crônica em crianças. Para o conjunto das regiões estudadas, 2,4%
das crianças investigadas apresentaram este diagnóstico, sendo que o Semiárido
apresentou déficit nutricional ainda maior, com frequência de 5,9%”, diz o
estudo.
O
risco de sobrepeso e obesidade também é evidenciado nas comunidades. Para o
total de crianças avaliadas, uma em cada cinco apresenta sobrepeso, apesar da
grande vulnerabilidade econômica e social destas populações. “Os quilombos do
Centro-Sul, situados perto de muitos centros urbanos e com alta densidade
populacional, têm 32,7% de suas crianças em situação de excesso de peso. Este
diagnóstico pode estar refletido na má qualidade da dieta que as crianças têm
acesso”.
O
sumário executivo da pesquisa está disponível na página da Secretaria de Avaliação e Gestão da Informação
(Sagi) do MDS.
“Os
resultados encontrados sinalizam para uma situação de grande vulnerabilidade
vivenciada pelos quilombolas. Como fator condicionante, poderiam ser
mencionados o isolamento geográfico e social, bem como a baixa integração dos
territórios quilombolas com outros espaços geopolíticos dos municípios em que a
oferta de bens e serviços públicos é maior. Uma vez que a relação com o
território é tão particular para este segmento, a violência decorrente dos
conflitos persistentes e dos problemas não resolvidos, em termos de ocupação
territorial, agrava este quadro”, de acordo com o sumário.
Segundo
a secretária da Seppir, Silvanir Euclênio Silva, os dados do estudo já estão
servindo de instrumental para elaborar políticas públicas que resolvam a
situação de vulnerabilidade em que os quilombolas se encontram, como a
potencialização da capacidade de produção das comunidades.
Ela
destaca ainda a importância da apresentação do estudo no Dia Nacional da
Consciência Negra, que, segundo ela, é o símbolo da capacidade de superação e
da resiliência e insurgência da população negra. “Um povo que foi capaz de
construir um herói [Zumbi dos Palmares] e uma data, celebrada de Norte a Sul do
país, independente[mente] das instituições, este dia representa a capacidade de
resgatar a humanidade que nos foi negada”, disse.