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(Millôr Fernandes)

quinta-feira, 22 de outubro de 2015

PRR4: Furacão 2000 terá de pagar multa de R$ 500 mil por desrespeito aos direitos da mulher pela "Um tapinha não dói"

Quinta, 22 de outubro de 2015
Do MPF
Empresa lançou música “Um tapinha não dói” que, segundo decisão judicial, incita violência
A 2ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), por voto de desempate, deu provimento a recursos do Ministério Público Federal (MPF) e da ONG Themis – Assessoria Jurídica e Estudos de Gênero e condenou a Furacão 2000 Produções Artísticas Ltda ao pagamento de R$ 500 mil de multa pelo lançamento da música "Um tapinha não dói". A decisão reforma sentença da 4ª turma do Tribunal e atende em parte pedido de ação civil pública (ACP) movida pelo MPF e pela Themis em dezembro de 2002.

Desde o início da tramitação do processo, a questão provocou muita polêmica. Tudo começou quando a Themis encaminhou representação ao MPF defendendo que as músicas "Tapa na Cara", do CD intitulado Pagod'art, da Gravadora Sony Music, e "Um tapinha não dói", do volume 2 da série de CD's Tornado Muito Nervoso, da Furacão 2000, banalizam a violência contra a mulher, transmitem uma visão preconceituosa contra a imagem da mulher e de seu papel social e as dividem em boas ou más conforme a conduta sexual. Também ressaltou que, na época, as músicas eram amplamente divulgadas pela televisão aberta, inclusive em programas com grande audiência do público infanto-juvenil.
Após instauração de inquérito, o MPF ajuizou ACP exigindo que Sony e Furacão 2000 pagassem indenização por danos morais pela violação dos direitos fundamentais, da honra e da imagem das mulheres e, também, da dignidade da pessoa humana, previstos na Constituição. Também considerou violados os direitos humanos previstos na Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (Convenção de Belém do Pará), da qual o Brasil é signatário. O MPF apontou que os limites de liberdade de expressão começam pelo respeito aos princípios fundamentais da Constituição. E, no caso de enfrentamento de dois direitos fundamentais, deve prevalecer o da dignidade humana.
A Instituição ainda pedia a responsabilização da União, que tem o dever de estimular os meios de comunicação a estabelecer diretrizes para erradicar a violência contra a mulher. “Músicas como 'Tapa na Cara' e 'Um tapinha não dói' enfraquecem toda e qualquer política governamental de respeito à dignidade da mulher, que há muito vem lutando para romper com o estigma de inferioridade e até subordinação em relação ao homem”, escreveu o MPF na ação.
Em primeira instância, o pedido foi parcialmente atendido pela Justiça Federal do Rio Grande do Sul, que julgou improcedente as responsabilidades atribuídas à Sony e a União, mas condenou a Furacão 2000 ao pagamento da multa de R$ 500 mil. A produtora recorreu e teve a decisão revertida, por maioria, na 4ª turma do TRF4.
O MPF interpôs embargos infringentes e, por voto de desempate, viu a sentença ser reformada novamente, com a reaplicação da multa. Segundo o desembargador federal Luiz Alberto d’Azevedo Aurvalle, cujo entendimento prevaleceu, a difusão das músicas contribui para o reforço de uma situação de vulnerabilidade social. O magistrado citou a necessidade de existência da Lei 11.340/2006, conhecida como Maria da Penha, para ressaltar o cenário de violência doméstica no Brasil: “Até mesmo uma lei especial e investimentos de conscientização foram e são necessários porque persiste enraizada na sociedade brasileira inconcebível violência contra a mulher".
Para ele, as músicas são incitação à violência de gênero ou aval a condutas criminosas e transmitem a jovens e público em geral a noção errônea de que a regra é que mulher gostar de sofrer. Ainda defendeu que mesmo o repúdio geral à censura não implica irrestrita possibilidade de divulgação e comunicação de tudo. “Deve-se ponderar todos os demais direitos fundamentais, sob pena de o cidadão ficar refém de mídia onipotente, visando apenas ao lucro, sem o cumprimento de escopos coletivos, insculpidos em tratados internacionais, na Constituição Federal e em diplomas legais”, afirmou.
Da decisão, ainda cabem recursos.
Acompanhe o processo: