Da Ponte
Direitos Humanos, Justiça, Segurança Pública
Ibís Pereira, comandante no fim de 2014, e Robson Rodrigues, coronel da reserva, são investigados por manifestar críticas sobre a política de segurança pública do RJ

Um ex-comandante e um coronel da reserva da Polícia Militar do Estado
 do Rio de Janeiro (PMERJ) foram indiciados pelo atual comando da 
corporação por criticarem a política de segurança pública do Estado. A 
investigação envolve críticas feitas pela dupla à instituição e política
 de segurança pública adotada pelas polícias cariocas.
O Coronel Ibís Pereira, ex-Comandante geral da PMERJ em 2014, e 
Robson Rodrigues, que ocupou postos-chave na hierarquia da corporação, 
são alvos de Inquérito Policial Militar (IPM). Os documentos não foram 
cedidos, sem explicitar quais as falas específicas ditas por Pereira ou 
Rodrigues são alvo da denúncia. A corporação enviará a denuncia ao 
Ministério Público, que determinará a abertura ou não de investigação.
“Estou trabalhando no momento em uma pesquisa sobre segurança pública
 fora do país e eis que acabo de ser indiciado em Inquérito Policial 
Militar pelo atual comando da PMERJ. Soube que, além de mim, o coronel 
Ibis também o foi. Suspendi o que fazia para responder à convocação de 
indiciamento e tomar oficialmente ciência dos motivos. Alguém consegue 
imaginar qual era a acusação? Pasmem: manifestar críticas na imprensa 
sobre a política de segurança pública do Rio de Janeiro, sem autorização
 de quem de direito. No meu caso, especificamente, era sobre a derrocada
 das UPPs”, escreveu o coronel da reserva, em sua página do Facebook.
Em conversa com a Ponte, Robson supõe que o 
dispositivo pelo qual ele está sendo julgado é o artigo 166 do Código 
Penal Militar, instituído em 1969. Segundo esse artigo, é crime 
“publicar, sem licença, ato ou documento oficial, ou criticar 
publicamente ato de seu superior ou assunto atinente à disciplina 
militar, ou a qualquer resolução do Governo”.
“Esse dispositivo é anacrônico, construído na ditadura”, avalia o 
oficial, que reitera todas as análises e críticas feitas à polícia 
carioca. “Eu não nego a autoria das críticas. Mas eu sou também um 
acadêmico e um pesquisador, sendo cobrado para apresentar evidências. Eu
 não irei contra as evidências para satisfazer o Comando.”
O indiciamento é a primeira parte de uma peça que precisa ser 
analisada pelo Ministério Público, que irá receber a denúncia da PMERJ e
 decidir o tipo penal, sua autoria, julgar as provas e sua 
materialidade.
O Coronel Ibís Pereira, ex-Comandante geral da PMERJ, também falou com a Ponte, mas preferiu não comentar o seu indiciamento, que tem as mesmas bases que a de Rodrigues.
Para Rafael Alcadipani, professor de Estudos Organizacionais da 
FGV-EAESP, tanto Robson quanto outros militares mais críticos à 
corporação representam uma ruptura na ideologia presente nas Polícias 
Militares. “Isso é completamente discordante da ideologia dominante 
nesses locais, que tende ao espectro político da direita” comenta, 
lembrando que Robson é um oficial de alta patente, tendo a patente de 
Coronel, a mais alta hierarquia da Polícia.
Robson é um reconhecido por crítica costumas do sistema militarizado 
da segurança pública brasileira, em especial da polícia fluminense. Suas
 análises e entrevistas já foram publicadas em diversos estudos 
inclusive internacionalmente.
“Penso que isso é mais uma tentativa de intimidação, pois 
dificilmente argumentos como esses, ou seja, de crítica não autorizada, 
se sustentam juridicamente”, comentou o ex-oficial, reiterando que esse 
inquérito fere frontalmente um direito maior, o artigo 5 da Constituição
 Federal de 1988, que trata da liberdade de expressão. “Deixo isso 
também como um alerta aos novatos. Se os policiais precisam defender os 
direitos individuais, nós também precisamos defender os direitos dentro 
da caserna”.
Em 2014, outro caso de indiciamento baseado no artigo 166 do Código 
Penal Militar chamou a atenção da mídia. O policial militar Darlan 
Menezes, na época com 39 anos, foi expulso da PMCE (Polícia Militar do 
Ceará) por ter escrito e distribuído um livro cujo teor “fere o decoro e
 o pundonor (decoro) militar”, segundo matéria publicada na ocasião pelo
 Portal G1.
Darlan Abrantes do Nascimento, de 39 anos, autor do livro intitulado 
“Militarismo: Um sistema arcaico de segurança pública”, conversou com a 
Ponte Jornalismo e lembrou do caso, que se arrastou por quatro anos na 
justiça e quase o levou à prisão.
Formado em filosofia e em teologia, o hoje pastor da Igreja batista 
afirmou ter feito esse livro com o propósito de mostrar que o 
militarismo não serve para a segurança pública. “Quando descobriram que 
no livro havia até mesmo falas de oficiais criticando o militarismo, o 
Comando me pressionou para conseguir os nomes”, sustentou, à época.
Sua expulsão da corporação aconteceu em janeiro de 2014, mas foi 
suspensa recentemente pelo TJCE. Enquanto sua volta à corporação ainda 
não acontece, Darlan pontua que apenas quer fazer com que a PM respeite a
 democracia. “Como que as Polícias Militares vão respeitar os cidadãos 
se elas não respeitam os próprios policiais?”, questiona.
A Ponte entrou em contato com a assessoria da PMERJ e, até a 
publicação desta reportagem, não obteve resposta para os questionamentos
 à seguir:
1 – Esses IPMs estão acessíveis ao publico? Caso sim, onde se pode acessá-la?
2 – Quais as infrações pelas quais os oficiais da reserva citados estarem sendo indiciados?
3 – Qual a data da publicação desse IPM e qual o corregedor responsável?
 
 
 
