Quarta, 29 de novembro de 2017
PARTE 1
Do Portal ContextoExato
Por Salin Siddartha
De acordo com dados do Escritório da ONU contra Drogas e Crimes, o
comércio ilegal do crime organizado registra ganhos anuais de mais de
US$ 2 trilhões. Este número equivale a cerca de 3,6% de tudo o que se
produz e é consumido no planeta em um ano. A lavagem de dinheiro se
transforma em um grande negócio que explica a soma total de mais de US$ 1
trilhão citada pelo Fórum Econômico Mundial, com base em uma pesquisa
de 2011 feita pelo Global Financial Integrity (GFI), um centro de
estudos de Washington. Essas cifras dizem respeito ao tráfico ilegal de
drogas, seres humanos, produtos falsificados, petróleo, vida selvagem,
órgãos e obras de arte. Tudo isso sem levar em conta o tráfico ilegal de
armas e os jogos de azar ilegais.
O sistema econômico mundial está metido até a medula no comércio ilegal
do crime organizado, principalmente em seu financiamento e na lavagem
do dinheiro obtido com esse comércio, utilizando as facilidades abertas
pelo grande capital financeiro. É, de fato, uma atividade empresarial.
Para disfarçar a ilegalidade de suas ações, os criminosos utilizam um
grande esquema de transferências bancárias e de criação de empresas
“laranjas”, além de contarem com a estrutura do sistema financeiro e se
beneficiarem de paraísos fiscais e da facilidade de comunicação e
transporte gerados pela globalização para transferir rapidamente
recursos de uma parte a outra do mundo sem serem controlados pelas
fronteiras nacionais.
Os centros financeiros internacionais são atrativos para o crime lavar
dinheiro. Grandes bancos aceitam de bom grado as centenas de bilhões de
dólares que são lavados anualmente. Ultimamente, a lavagem de dinheiro
das organizações criminosas imiscui-se cada vez mais no mercado de
moedas virtuais, tais qual o Bitcoin, pelo motivo de tal moeda não ser
regulada pelas instituições e escapar a qualquer controle fiscal.
O TRÁFICO DE DROGAS - O narcotráfico é uma sólida cadeia produtiva
agroindustrial, comercial e financeira assemelhada a uma empresa
transnacional que, segundo dados da INTERPOL, movimentou, só no ano de
2011, cerca de 320 bilhões de dólares, mas que, agora, se traduz em
aporte maior. Em torno do narcotráfico giram técnicas sofisticadas de
administração e estratégias de negócio. Atingir o braço financeiro do
tráfico de drogas e suas engrenagens é de extrema importância para a
desarticulação das células criminosas.
É que, embora alguns negócios escusos, como o tráfico de armas,
movimentem-se também com certos escambos que envolvem, por exemplo, a
troca das mercadorias e do dinheiro faturado por esmeraldas, diamantes,
ouro e outros produtos, o tráfico de drogas só se movimenta com
dinheiro. E isso precisa da mecânica de uma lavagem feita em paraísos
fiscais, no subfaturamento do comércio internacional e no mercado negro
de divisas. Portanto uma boa medida para derrubar o tráfico de drogas
seria sufocá-lo financeiramente; no entanto o mercado financeiro
internacional não tem dado abertura suficiente para isso, pois a
desregulamentação financeira internacional abriu as comportas do sistema
econômico mundial para uma enxurrada de narcodólares lavados em
paraísos fiscais, e parte da economia do planeta depende do dinheiro das
drogas ilícitas.
É triste reconhecer que haveria uma crise econômica se retirassem do
sistema financeiro os numerários do mercado das drogas, em razão de,
geoeconomicamente, termos países que dependem da economia movimentada
pelo narcotráfico.
Exemplificando, no Vale do Bekaa (Líbano), mais de 400 mil pessoas
trabalham no plantio da erva canábia e na produção de haxixe. A economia
do Marrocos também depende do plantio e produção dessa droga. Na
tentativa de descriminalizar a maconha, durante os governos de Ernesto
Zedillo e César Gaviria, o México quebrou, porque a única indústria
próspera daquela nação era a da produção de drogas ilícitas.
Acrescente-se o fato de haver nações que estão buscando fonte de renda
nas drogas, e temos o coquetel de grana rolando mundo afora e enchendo
as burras de quem nele investe – inclusive, muitos investidores do
narcotráfico que não aparecem como criminosos, mas dão apoio pecuniário à
gestão do esquema ilícito. As altas esferas do poder de diversos países
estão metidas com o narcotráfico.
Só para ilustrar, há muito tempo a Receita Federal vem constatando que a
movimentação das agências bancárias, nas cidades das fronteiras
brasileiras pelas quais passa o tráfico de drogas, ultrapassa o limite
do compreensível e não é compatível com o que se arrecada na região.
Nesse esquema, é forçoso constatar que os “grandes” traficantes que se
encontram, no momento, nos presídios de segurança máxima, no Brasil, em
verdade deveriam ser considerados “fichinhas” que se posicionam no
quarto ou quinto escalão da hierarquia do tráfico. Acima deles estão
colocados os que financiam e lavam o dinheiro do comércio das drogas,
muitos dos quais vivem confortavelmente instalados em escritórios e
gabinetes com ar condicionado, assessores, secretárias, etc., apesar de
nossa institucionalidade conhecê-los, ou ter condição para tal, mas
fazer questão de escondê-los, pois estaria atormentando figuras de
“projeção social”. Têm vindo à luz informações comprometedoras de
políticos, policiais, juízes, empresários e banqueiros corrompidos pelos
cartéis do narcotráfico no Brasil.
É interessante registrar que, na condição de maiores exportadores de
cocaína do mundo, Bolívia, Colômbia e Peru não possuem indústrias
químicas, fator indispensável para transformar a folha de coca em
cloridrato de cocaína. É o Brasil, especificamente no eixo Rio-São
Paulo, quem fabrica e trafica os insumos químicos necessários para
aqueles países refinarem o pó branco destruidor de lares e causador de
tantas mortes e assassinatos.
O tráfico de drogas ilegais também é um grande mercado para os lucros
das indústrias bélicas, pois é, de certa forma, alimentado
operacionalmente por ela. A prostituição ilícita é outra prática
criminosa utilizada para desenvolver o tráfico de drogas.
O que preocupa os países hegemônicos é que a camada intermediária do
tráfico dos países exportadores de drogas se beneficie economicamente
com um enriquecimento capaz de ameaçar os grandes capitalistas
dominadores desse mercado. Por isso, promovem o ataque à periferia
social, às plantações e aos centros de produção nos países da América
Latina e África, a fim de impedir o crescimento da acumulação primitiva
do capital que permita o surgimento de grandes fortunas no âmbito do 4º e
5º escalões do tráfico. Todavia, a repressão que coordenam dá o tempo
suficiente para que as plantações e os centros de produção vão-se
recuperando e novos chefes e gerentes do tráfico vão surgindo, porque o
crime organizado internacional requer capital para movimentar. Mas,
decorrido algum tempo, novamente os liquidam. Assim acabaram com o
Cartel de Medelin, Pablo Escobar e Fernandinho Beira Mar, por exemplo,
porém, outros já ocupam o lugar deles... E os negócios não param. Ao
contrário de São Paulo, onde o tráfico está unificado, o Rio de Janeiro
apresenta uma grande divisão de quadrilhas na base do comércio de drogas
ilegais, forçando uma repressão praticamente cotidiana e muito maior do
que a que ocorre na região paulista, em razão da anarquia que prevalece
na relação dos gerentes e chefes de gangues locais para com o grande
complexo industrial, comercial e financeiro do narcotráfico.
Destaque-se que os países hegemônicos não combatem a lavagem de
narcodólares nem reprimem o tráfico em seu próprio território com a
mesma intensidade com que o fazem nos países periféricos.
(Em face da complexidade do assunto ter tornado impossível a elaboração
de um texto mais curto, no próximo artigo continuaremos a tratar do
tema, abordando os outros tráficos e práticas criminosas mancomunadas
com o mercado financeiro mundial e com o acobertamento da
institucionalidade brasileira atual.)
Cruzeiro-DF, 28 de novembro de 2017
SALIN SIDDARTHA
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