Segunda, 13 de novembro de 2017
Do MPF
Procuradores reforçam risco de impunidade; pelos critérios atuais, alguém condenado a 12 anos pode cumprir apenas dois
A força-tarefa Lava Jato do Ministério Público
Federal no Paraná (MPF/PR) encaminhou, nesta sexta-feira (10), uma carta
ao Conselho Nacional de Política Penitenciária e Criminal (CNPCP),
sugerindo alterações na extensão do indulto natalino realizado
anualmente pelo presidente da República. A iniciativa mostra uma
preocupação com a impunidade da grande corrupção identificada na Lava
Jato e outras grandes investigações.
O indulto é o perdão das penas de criminosos e, caso
mantidos no futuro os critérios do último decreto de indulto (n.º
8.940/16), diversos réus condenados por crimes gravíssimos na Operação
Lava Jato cumprirão penas irrisórias. Pelos critérios atuais, “um
condenado por corrupção a 12 anos de prisão será indultado após cumprir 3
anos, se for primário. Um condenado por corrupção a 12 anos de prisão,
se for primário e tiver mais de 70 anos de idade, será indultado após
cumprir apenas 2 anos”.
Num levantamento preliminar com base em decisões
proferidas pela Justiça Federal do Paraná e pelo Tribunal Regional
Federal da 4.ª Região (TRF4), pelo menos 37 réus que já foram condenados
a penas privativas de liberdade inferiores a 12 anos na Lava Jato.
O documento ressalta que réus de colarinho branco,
tradicionalmente, não são reincidentes. Isso se dá porque seus crimes
raramente são punidos, e não necessariamente pela correção de seu
passado, ou, quando são condenados, as penas são extintas por
prescrição, caso em que permanecem na condição de primários.
Além disso, o perfil dos criminosos do colarinho branco é
de pessoas de meia-idade e, em decorrência da longa duração de seus
processos, a pena só é executada quando possuem mais de 60 ou 70 anos e
muitos anos depois da prática dos ilícitos. Isso aconteceu, por exemplo,
como aponta o ofício, nos casos "Lalau" e "Maluf".
Segundo a carta, a amplitude do indulto pode tornar a
corrupção “um crime de baixíssimo risco no Brasil”, em especial quando
se consideram a pena baixa e as dificuldades de descobrir, comprovar e
aplicar uma pena aos criminosos. Os procuradores mencionam ainda um
estudo da Transparência Internacional que aponta, entre os riscos de
indultos excessivos, a perda do efeito dissuasório da pena, o
enfraquecimento do Estado de Direito, o florescimento de uma cultura de
impunidade, a desmotivação na condução de investigações e a diminuição
da confiança no sistema de justiça, o que pode criar um ambiente
favorável à corrupção e aos crimes em geral.
Outro ponto a ser destacado no documento enviado à CNPCP
é que o indulto da corrupção não contribui para a solução do problema
carcerário, pois, conforme o “Mapa do encarceramento: os jovens do
Brasil”, da Secretaria-Geral da Presidência da República no ano de 2014,
os crimes contra a Administração Pública no período entre 2008 e 2012
correspondem a apenas 0,4% dos presos, o que ainda engloba vários crimes
diferentes da corrupção. Ou seja, o indulto de corruptos não traz
benefícios relativos à redução da população carcerária e, no contexto da
corrupção, tem efeitos altamente maléficos.
No documento, os procuradores sugerem que o indulto
natalino não seja estendido a crimes de corrupção e relacionados. Se não
aceita a sugestão, a força-tarefa propõe que a concessão do indulto
fique sujeita a outras condições, como o ressarcimento aos cofres
públicos, do mesmo modo como ocorre com outros benefícios penais. A
adoção dos critérios atuais torna as condições de indultos recentes
excessivamente benéficas para réus de corrupção e outros crimes contra a
Administração Pública. ``A expedição de indulto nesse contexto pode
caracterizar, até mesmo, excesso do poder de indultar, violando o
princípio constitucional da vedação da proteção deficiente´´, destaca
trecho do documento.
Para o procurador coordenador da força-tarefa, Deltan
Dallagnol, “no caso da corrupção, o indulto não contribui para diminuir a
superpopulação carcerária porque quase ninguém está preso por esse
crime no Brasil. Hoje, o corrupto que foi condenado a 12 anos cumpre
apenas 2 ou 3 e é perdoado no Natal, mesmo que não tenha devolvido um
centavo dos milhões que desviou. Ou seja, 75% ou mais da pena do
corrupto é perdoada e ele continua com os bolsos cheios. Isso é um
ultraje ao mais básico sentimento de justiça e passa a mensagem de que a
corrupção vale a pena”.
Critérios - Os critérios para concessão
do indulto já sofreram alterações em pelo menos dois períodos recentes.
Entre os anos de 2007 e 2009 o critério geral para concessão do
benefício era a condenação a pena privativa de liberdade não superior a 8
anos e o cumprimento de 1/3 da pena, se não reincidente, ou metade, se
reincidente. O mesmo critério era adotado para condenados a pena
superior a 8 anos que tivessem mais de 60 anos.
A partir de 2010 até 2015 houve diferenciação para
crimes praticados sem grave ameaça ou violência à pessoa (corrupção),
para os quais o critério passou a ser condenação a penas privativas
inferiores a 12 anos e o cumprimento de 1/3 da pena, se não
reincidentes, ou de metade, se reincidentes. Nesse mesmo período, além
de se manter o critério anterior para pessoas com 60 anos completos,
passou-se a adotar critério específico para pessoas maiores de 70 anos
com a concessão de indulto a partir do cumprimento de 1/4 da pena se não
reincidente, e 1/3 se reincidentes.
O Decreto 8.940/16, contudo, novamente alterou os
critérios para a concessão de indulto aos condenados sem grave violência
ou ameaça (aí a corrupção) a partir do cumprimento de ¼ da pena, se não
reincidentes, e 1/3, se reincidentes (Art. 3º do Decreto 8.940/16) e,
nas hipóteses especiais que abrangem pessoas maiores de 70 anos de
idade, reduzir o critério de cumprimento da pena para 1/6, para não
reincidentes, e ¼ para reincidentes.
Confira aqui a carta enviada ao CNPCP.
Confira aqui a carta enviada ao CNPCP.